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Publicado em

04/09/2024

O que o mercado brasileiro tem a dizer sobre desenvolvimento sustentável?

Grandes empresas brasileiras e transnacionais discutem práticas e rumos para uma economia com menor impacto socioambiental.

Por Isadora Morena

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Seminário CEBDS 2024 aconteceu em Natal, RN, líder na produção de energia eólica. Foto: Isadora Morena.

A crise climática e socioambiental mostra a necessidade urgente de transformação no modo de produção e consumo de bens e serviços em escala mundial. É preciso uma nova perspectiva de atuação econômica que tenha como prioridade o cuidado com a Terra e sua biodiversidade, incluindo a humanidade. O que as grandes empresas que atuam no Brasil pensam sobre isso? 

Em seu último seminário, realizado no dia 28 de agosto em Natal (RN), o Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) reuniu empresas de diversos setores econômicos do país – como produção de energia, alimentos, mineração, finanças e saneamento – para discutir o tema “Transição Energética Justa, integrada à Natureza e Sociedade”. 

Natal foi escolhida para sediar o seminário por ser a capital do estado brasileiro líder na produção de energia eólica. A transição energética, tendo a fonte eólica como principal matriz, foi a discussão transversal de todo o evento, que também debateu a agricultura regenerativa, a biodiversidade, os direitos humanos e as mudanças climáticas. 

Além de líderes empresariais, os painéis temáticos trouxeram a perspectiva de autoridades governamentais, pesquisadores e representantes da sociedade civil. 

Agricultura regenerativa

Barbara Sapunar, diretora executiva de Business Transformation da Nestlé, foi uma das painelistas do seminário e apresentou que a empresa transnacional do setor alimentício tem apostado na agricultura regenerativa como forma de mudar sua pegada de carbono, ou seja, seu impacto ambiental em volume de emissão de gases de efeito estufa (GEE).

A agricultura regenerativa, novo conceito bastante utilizado no meio empresarial, é, segundo a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), fundamentado em “práticas agrícolas que mantenham ou até melhorem a capacidade produtiva do solo”. Entre essas práticas está a recuperação de áreas degradadas e o cuidado com a vida microbiana da terra em que se cultiva.

De acordo com Barbara, a Nestlé assumiu uma visão sistêmica e integral de todos os elos da sua cadeia de produção e descobriu que dois terços de sua pegada de carbono eram referentes à origem dos ingredientes. A empresa, portanto, tem a meta de que, até 2025, 30% dos ingredientes – em especial leite, café e cacau – sejam produzidos por meio da agricultura regenerativa.

Para isso, a transnacional criou uma série de programas para fornecer assistência técnica e realizar incentivos financeiros aos “agroempreendedores” vinculados à sua produção, a fim de que adotem novas medidas regenerativas. 

Um deles, o Programa Nature por Ninho, é associado à cadeia leiteira e promove o incentivo a práticas como conservação dos recursos hídricos, manejo de dejetos e resíduos, cultivo mínimo e cobertura do solo, rotação de culturas e ações de saúde animal.

Segundo a liderança, os programas também preveem a melhoria do bem-estar dos produtores rurais. Ela afirma que “não há regeneração sem as pessoas junto, pois não há natureza dissociada do ser humano”.

Neidimar Pereira, produtora rural de leite e integrante do Programa Nature por Ninho, também esteve presente no painel e apresentou que a adoção da agricultura regenerativa ampliou significativamente a produtividade por hectare em sua propriedade. Para ela, “a agricultura regenerativa é vida para todos”. 

Por dentro dos conceitos: agroecologia versus agricultura regenerativa

A agroecologia, abordagem científica e prática que integra princípios ecológicos na produção agrícola, tem um enfoque mais amplo do que a agricultura regenerativa. A agroecologia inclui aspectos sociais, culturais e políticos, e busca transformar o sistema agrícola como um todo.

Já a agricultura regenerativa foca na restauração e revitalização dos recursos naturais dentro do contexto agrícola. Ambas visam a sustentabilidade, mas a agroecologia tem um escopo mais amplo e holístico, enquanto a agricultura regenerativa é mais centrada na regeneração ecológica.

Biodiversidade

Outro tema abordado no seminário foi a meta 15 do Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal, firmado na 15ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), realizada em dezembro de 2022 em Montreal, no Canadá. Ela ​​prevê que as companhias transnacionais e instituições financeiras atuem para monitorar, avaliar e divulgar, com transparência, suas dependências, riscos e impactos à biodiversidade.

O painelista Bráulio Dias, diretor de Conservação e Uso Sustentável da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, enfatizou a importância do cuidado com a natureza para a economia, afirmando que “no mínimo, metade do PIB [Produto Interno Bruto] do Brasil e do mundo são dependentes da biodiversidade”. 

Ao falar em biodiversidade, o pesquisador também incluiu os chamados serviços ecossistêmicos: as empresas dependem de água, matérias-primas, alimentos etc.

Segundo Bráulio, “chama atenção que, dos vários parâmetros criados internacionalmente como essenciais para manter o planeta Terra funcionando adequadamente e atendendo às necessidades sociais humanas, o que mais avançou negativamente foi a biodiversidade, ultrapassando os limites da sustentabilidade”.

Esse dado reforça a necessidade de as empresas documentarem melhor seus níveis de dependência, riscos e impactos, tanto negativos quanto positivos, para com a biodiversidade.

Para o diretor, “muitas empresas ainda tratam da sustentabilidade como algo marginal, como uma obrigação legal ou pela demanda dos consumidores, sem entender a real importância para assegurar sua própria sobrevivência”.

Transição energética

O debate da produção energética passou por todos os painéis do seminário, que se encerrou com a presença de Elbia Gannoum, presidente da Associação Brasileira de Energia Eólica e Novas Tecnologias (ABEEólica), destacando os avanços trazidos pela adoção da energia eólica no Brasil, que já é a segunda fonte de energia de grande volume do país. 

Segundo Elbia, o mercado de energias renováveis alavancou a região Nordeste. Estudos da ABEElólica apontam que de 2009 a 2017, o PIB da região cresceu em 21% e o Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) em 20%. Ela também afirma que, a cada um real investido em energia, quase três reais (2,9) retornam para a economia.

Elbia aponta também que os problemas que têm aparecido na mídia recentemente em relação à impactos socioambientais e violações de direitos humanos na instalação e funcionamento de parques eólicos estão passando por diagnóstico e que foi criado um guia de boas práticas para o setor. 

“Nós estamos indo atrás de soluções, porque investir em mitigação e reduzir riscos e insatisfações, ou qualquer coisa atrelada à nossa imagem, é muito importante para os nossos negócios”, afirma a liderança empresarial.

O que é o CEBDS

O Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) é uma associação civil sem fins lucrativos que promove o desenvolvimento sustentável por meio do envolvimento com governos e sociedade civil, além de divulgar conceitos e melhores práticas sobre o tema. 

Reúne mais de 110 dos maiores grupos empresariais do país e conta com oito câmaras temáticas e grupos de trabalho. Fundado em 1997, é o primeiro e principal representante do setor empresarial na transformação para um modelo econômico sustentável, que valorize as vantagens brasileiras para entregar ao mundo produtos com baixo impacto ambiental.

>> Saiba mais em: cebds.org

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