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19/06/2024

O direito ao Bem Viver em meio às diferenças das cidades brasileiras

Garantia de direitos humanos aliada ao cuidado efetivo e estratégico com a natureza é um desafio no contexto urbano brasileiro, diante de municípios que cresceram com pouco ou sem nenhum planejamento ou diretriz social e ecológica.

Por Maria Victória Oliveira

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Ação de entrega de cestas básicas para famílias em situação de vulnerabilidade social nas
periferias de São Paulo durante a pandemia de Covid-19, em junho de 2021. Foto: Matheus Alves

Não é por acaso que mulheres negras, grupo que historicamente sofre uma multiplicidade de violências, está há, pelo menos, 10 anos pautando o Bem Viver.

O ano era 2015 quando Nilma Bentes, engenheira agrônoma, ativista do movimento negro e uma das fundadoras do Centro de Estudos e Defesa do Negro do Pará (CEDENPA), viu a sua proposta da Marcha Nacional de Mulheres Negras tomar as ruas de Brasília pautando o tema “contra o racismo e pelo Bem Viver”. A própria Nilma havia conhecido o conceito do Bem Viver um pouco antes, em 2009, e entendeu que abordar esse assunto seria uma forma de expandir o debate para além do racismo e, com isso, trazer mais pessoas ao movimento.

Nilma Bentes. Foto: Joyce Cursino

Hoje em dia, além de continuar falando sobre o Bem Viver – que vai, novamente, ser tema da edição 2025 da Marcha Nacional, juntamente com um chamado por reparação histórica –, Nilma agrega outras terminologias, herdadas de saberes ancestrais. É o caso de Ubuntu, filosofia africana, fundada em conceitos como respeito, solidariedade e humanidade, e Teko Porã, termo em guarani que significa “belo caminho” ou Bem Viver. “O Ubuntu é muito bonito. Ele fala que ‘eu sou porque nós somos’. Quando vamos a fundo nessa frase, entendemos que nem existe o outro, pois, se eu sou porque tu és, então nós somos um.”

Para Naiara Leite, coordenadora executiva do Odara – Instituto da Mulher Negra, uma organização negra feminista, centrada no legado africano, sediada em Salvador, na Bahia –, Ubuntu convoca um pensamento centrado em generosidade e solidariedade. “Se esses princípios não fossem tão centrais em nossas comunidades, muitas de nós teriam morrido de fome”, defende. Representante da Articulação de Mulheres Negras (AMNB) no Comitê Nacional, responsável pela organização da Marcha em 2015, Naiara analisa que as comunidades negras e indígenas conseguiram preservar, ao longo do tempo, uma outra ideia de generosidade humana e vivência coletiva.

Naiara Leite. Foto: Comunicação Instituto Odara

A coordenadora problematiza que só será possível avançar quando a sociedade acreditar no Bem Viver não como uma utopia de mulheres negras ou indígenas, mas quando pessoas não mais se permitirem viver e projetar política em um modelo de sociedade estruturada pelo colonialismo e capitalismo racista patriarcal, no qual parcelas importantes da população estejam morrendo e sendo excluídas de espaços de poder.

“O Bem Viver, enquanto projeto político de nação, traz uma concepção a partir de uma cosmovisão. Às vezes vejo campanhas eleitorais que falam ‘por uma sociedade do Bem Viver’. E fico me perguntando se estão compreendendo o que estamos falando, porque um projeto centrado no agronegócio ou na morte das crianças negras não pode estar falando de Bem Viver”, problematiza Naiara.

Conceituando o Bem Viver

Mas o que é, afinal, o Bem Viver? Alberto Acosta, economista e político equatoriano, defende, em seu livro O Bem Viver: uma oportunidade para imaginar outros mundos (2016), que a democracia, os direitos humanos e a natureza são pilares centrais e fundamentais para pensar em um outro mundo.

Reconhecendo as origens ancestrais do conceito, Acosta elenca alguns princípios que o Bem Viver traz consigo, como “sua proposta de harmonia com a Natureza, reciprocidade, relacionalidade, complementaridade e solidariedade entre indivíduos e comunidades, com sua oposição ao conceito de acumulação perpétua”, questionando uma visão eurocêntrica do bem-estar.

Segundo o pensador, apesar de representar um desafio, é possível praticar o Bem Viver em outros lugares do planeta, inclusive em países industrializados e em “comunidades imersas no turbilhão do capitalismo”, e não limitar o debate às realidades andinas e amazônicas, que são duas entre as várias fontes inspiradoras do conceito.

Outro documento que pauta o bem comum é a Encíclica Laudato Si’, publicada pelo Papa Francisco em 2015. Em maio, a Encíclica completou nove anos, mas seu chamado continua mais atual do que nunca: para que “todas as pessoas de boa vontade” considerem o cuidado com a Casa Comum e tenham em mente a urgência imposta pelas mudanças climáticas, causadas, sobretudo, pela ação humana. Confira, no site da revista, uma nota em razão do aniversário da Encíclica e a relação entre a mensagem da Carta e a importância de ações climáticas no âmbito das cidades, e o encontro que Papa Francisco teve com líderes das principais cidades do mundo.

Acesse: bit.ly/LaudatoSi9anos

Complexidade do tema

Apesar do que defende Alberto Acosta, parece um desafio e tanto pensar em estratégias em uma tentativa de aplicar o Bem Viver e seus princípios em cidades que foram desenvolvidas sem planejamentos urbanos aprofundados ou grandes preocupações com o direito das pessoas ou da natureza. Afinal, o crescimento urbano desenfreado que o Brasil tem testemunhado há décadas exclui, segrega e nega que corpos em suas infinitas diversidades tenham assegurados os seus direitos de existir e de ir e vir nas cidades.

Melhorar o cenário atual dos municípios, entretanto, é uma preocupação global. O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 11 – que visa tornar as cidades e os assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis – prova não só que o tema é fundamental, mas também mostra como a agenda acarreta muitas outras temáticas: moradia, mobilidade, alimentação, urbanização sustentável, adaptação a mudanças climáticas, garantia de direitos de todos e todas, acesso à água e ao saneamento, e mais.

A multiplicidade das cidades brasileiras

A um contexto de multiplicidade de temas dentro da agenda das cidades, soma-se outra problemática: a heterogeneidade dos municípios brasileiros. Em um país continental como o Brasil, existem inúmeras realidades entre os seus 5.570 municípios, diferentes em termos de tamanho, localização, número populacional, clima, demandas e especificidades do território.

Ministério das Cidades

Pensando em uma forma de ter um espaço destinado especificamente a pensar nos desafios e na problemática das cidades brasileiras e toda a complexidade trazida pelas diferentes características e demandas entre elas, foi criado o Ministério das Cidades (MCID), órgão da administração pública federal responsável por tratar da política de desenvolvimento urbano e das políticas setoriais de habitação, saneamento ambiental, transporte urbano e trânsito. Para endereçar tantas temáticas, o MCID conta, além de órgãos colegiados como o Conselho das Cidades e, também, as assessorias, com cinco Secretarias Nacionais: de Desenvolvimento Urbano e Metropolitano, de Mobilidade Urbana, de Saneamento Ambiental, de Habitação e, ainda, uma inovação com a criação da Secretaria Nacional de Periferias.

>> Conheça o Ministério das Cidades: bit.ly/RCC_09_04

Ruas da cidade de Cuiabá (MT). Foto: Matthieu Rougé

De acordo com o Índice de Desenvolvimento Sustentável das Cidades – Brasil (IDSC-BR), do Programa Cidades Sustentáveis – que usa 100 indicadores para avaliar a classificação dos municípios brasileiros quanto ao progresso do cumprimento dos 17 ODS –, 85 das 100 cidades que melhor pontuaram são do estado de São Paulo. No top 100, não há nenhuma cidade das regiões Norte e Nordeste, que, ao contrário, predominaram nas últimas posições. Os 10 municípios com as piores classificações são de três estados: Maranhão, Amazonas e Pará.

O Índice tem 100 como pontuação máxima. Ou seja, até a melhor colocada, São Caetano do Sul, em São Paulo, com 63,42 pontos, está distante do desempenho máximo na agenda dos ODS. A pior, por sua vez, é Buriticupu, no Maranhão, com 29,79 pontos.

Para Igor Pantoja, coordenador de relações institucionais do Instituto Cidades Sustentáveis, um fenômeno que explica esse cenário é uma questão histórica e estrutural de investimento concentrado em certas regiões do país que já são privilegiadas, mas não só isso.

Igor Pantoja. Foto: Divulgação Instituto Cidades Sustentáveis

O Mapa da Desigualdade entre as Capitais, outra iniciativa do Instituto Cidades Sustentáveis, usa 40 indicadores para avaliar as 26 sedes estaduais brasileiras, e os resultados são alarmantes. No âmbito do ODS 11, Campo Grande (MS) tem o melhor indicador, com 1,4% dos domicílios em favelas. Já Belém (PA) fica com o pior indicador, com 55% dos domicílios nessa situação.

No desempenho geral, que considerou a soma dos pontos dos indicadores, enquanto o melhor colocado, Curitiba (PR), pontuou 677, o pior, Porto Velho (RO), somou 373. “Além de uma questão histórica de desigualdades, Porto Velho tem um fenômeno muito importante que é a degradação urbana de uma cidade que recebeu duas hidrelétricas nos últimos 20 anos. A violência com que esses projetos chegam em uma cidade é muito destrutiva”, analisa Igor.

Ele vê com preocupação a situação das capitais brasileiras, que abrigam 43 milhões de pessoas – ou 22% da população. “Outros indicadores do mapa também mostram que as capitais, que deveriam ser, entre aspas, as melhores cidades de cada estado, já que têm mais recursos, estão passando por uma situação muito preocupante em alguns temas que não é só infraestrutura, mas acesso a serviços básicos.”

Intersetorialidade e participação

Considerando esses verdadeiros abismos que separam os municípios brasileiros, Igor defende que as soluções sejam pensadas de acordo com as demandas de cada localidade. Em sua visão, o caminho é investir na intersetorialidade, isto é, fazer com que diferentes áreas conversem entre si para a proposição de ações conjuntas.

“Na saúde, por exemplo, uma política intersetorial não olha apenas se há uma Unidade Básica de Saúde perto da casa da pessoa, mas também se há escolas e creches, se a família tem alguma renda, se sua alimentação está boa, se ela tem acesso a benefícios sociais. É uma análise mais complexa para propor intervenções específicas para aquele território. Isso pode ser feito em qualquer tamanho de cidade e não custa quase nada. O que custa é redesenhar a máquina pública para pensar dessa maneira”, reflete, destacando que essa pode ser uma saída interessante para que municípios pequenos, por exemplo, que, em muitos casos, enfrentam cenários de falta de recursos, consigam otimizá-los.

E essas propostas podem partir da própria população, desde que ela tenha instrumentos que facilitem sua participação. Igor cita a territorialização das políticas públicas no sentido de o poder público, em primeiro lugar, ter uma abertura ao diálogo, com processos de escuta aberta e efetiva das demandas nos territórios, para, em seguida, promover a participação e a descentralização, isto é, que as regiões da cidade também tenham a capacidade de formulação de políticas.

“São Paulo tem 32 subprefeituras, cada uma com quase 500 mil habitantes. Isso é maior que 99% das cidades brasileiras. Não há como termos cidades inclusivas sem escuta no território, e se a população não tiver incidência sobre a própria região. Quando a pessoa vê acontecer o que ela propõe, se sente empoderada e há um fortalecimento da comunidade local”, defende Igor, que reforça a importância de uma política permeável, que possa ser implementada de formas diferentes.

Política excludente

Diante de um contexto de demandas diferentes em cada localidade, para Renato Pequeno, arquiteto e urbanista, professor da Universidade Federal do Ceará (UFC) e coordenador do Laboratório de Estudos da Habitação (LEHAB), a elaboração de diagnósticos territoriais pode oferecer uma melhor compreensão dos desafios que cada localidade enfrenta e, a partir disso, é possível o desenvolvimento de análises a fim de verificar se são questões pontuais ou generalizadas.

Renato Pequeno. Foto: Arquivo pessoal

Renato usa o exemplo da moradia para afirmar que é fundamental analisar cada território e região individualmente, sem uma mesma solução para todos. “A questão da moradia no Ceará, por exemplo, é muito diferente do Pará. No Ceará, se eu disser que moro em uma casa de madeira, vão dizer que moro em um barraco. Mas uma casa de madeira na Amazônia é uma moradia tradicional das comunidades ribeirinhas, habituada ao regime de cheias e de seca das águas, diferente do que aconteceu agora no Rio Grande do Sul.”

Rio Guaíba, usina do gasômetro, em Porto Alegre, após chuva intensa em maio. Foto: Gilvan Rocha/Agência Brasil

O desafio das mudanças climáticas

No contexto da América Latina e Caribe, o Brasil foi, em 2022, o país com o maior número de pessoas deslocadas em razão de eventos climáticos, como cheias e enchentes, com 708 mil deslocamentos, segundo o Relatório Mundial sobre Migração de 2024, uma iniciativa da Organização Internacional para as Migrações (OIM). No mundo todo, entre as 71,2 milhões de pessoas deslocadas internamente em 2022, 8,7 milhões o fizeram devido a desastres.

Especialistas e estudiosos alertam que, daqui para frente, os fenômenos climáticos serão cada vez mais frequentes e intensos. O Brasil deve esperar novos acontecimentos ainda em 2024 em razão de massas de ar – sejam naturais sejam provocadas pela ação humana – que contribuem para muitas chuvas ou a falta delas, como explica Humberto Barbosa, fundador e coordenador do Laboratório de Processamento de Imagens de Satélite da Universidade Federal de Alagoas (Lapis), via reportagem do UOL.

O cenário torna-se ainda mais preocupante diante da declaração de Cláudia Lins, gerente de sustentabilidade da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Segundo ela, apenas 22% dos gestores de 3,6 mil cidades brasileiras pesquisadas consideram seus municípios preparados para enfrentar as mudanças climáticas. Os dados são de um estudo ainda em andamento, conforme divulgado pela Agência Brasil.

Confira:

– Relatório Mundial sobre Migração 2024 (em inglês): bit.ly/RCC_09_07
– “Muitos extremos climáticos podem atingir país em 2024”, alerta pesquisador: bit.ly/RCC_09_08
– Apenas 2 em cada 10 cidades estão preparadas para mudanças climáticas: bit.ly/RCC_09_09

A 7ª edição da Revista Casa Comum trouxe como pauta central, em todas as suas matérias e reportagens, o “Planeta em colapso: a urgência do agir ecológico”.

Acesse a revista que está disponível em: bit.ly/RCC_7ed

Seja qual for o cenário, Renato entende que as condições de moradia correspondem a um dos melhores indicadores para perceber quão desigual uma cidade é, ao analisar se há, num mesmo espaço, pessoas vivendo muito bem e outras muito mal. O desafio remonta do período ao final da escravização, quando não houve preocupação com a moradia, o que vem se replicando historicamente com a origem de favelas e quilombos.

“Ao longo do tempo, Fortaleza recebeu levas de retirantes que fogem da seca no sertão e chegam na cidade. Sem ter onde morar, no início, a população ficava em verdadeiros campos de concentração. Mas à medida que a própria cidade começa a absorver essas pessoas, isso faz com que mais de 40% da população de Fortaleza viva em favelas. E eu temo que o próximo Censo aponte que seja a metade. É aí que conseguimos perceber que as políticas de desenvolvimento urbano são excludentes e não têm cumprido o seu papel”, analisa Renato.

Para ele, as políticas têm sido a favor do setor imobiliário, garantindo a construção de edifícios e um processo de gentrificação, em que a população pobre vai sendo deslocada para áreas precárias e substituída por aquela que consegue atender ao que o mercado exige. “Nesse sentido, eu digo que, infelizmente, a política de desenvolvimento urbano tem chegado às cidades não para combater, mas para reforçar as disparidades sociais.”

Favelas e periferias como parte do tecido urbano

“Os dados sempre foram – e hoje são ainda mais – importantes para pautarmos qualquer ação ou lutarmos por políticas públicas.” A frase é de Maria Ribeiro, produtora de conteúdo do data_labe, organização da sociedade civil em formato de laboratório que promove a democratização do conhecimento por meio da geração, análise e divulgação de dados com foco em raça, gênero e território a partir do Complexo da Maré, um bairro composto por 16 favelas e 140 mil habitantes localizado na zona Norte do Rio de Janeiro.

Um exemplo dessa atuação é o Cocôzap, do qual Maria é codesenvolvedora: um projeto de mapeamento, incidência e participação cidadã sobre saneamento básico em favelas, no qual as pessoas enviam para um número de WhatsApp denúncias, fotos, vídeos e narrativas sobre lixo e esgoto no Complexo da Maré. Segundo o Censo de 2022, 62,5% da população do Brasil mora em domicílios conectados à rede de coleta de esgoto.

Para ela, o racismo ambiental é um fenômeno que ajuda a explicar muitas violações de direitos que populações periféricas – como a da Maré – sofrem: descaso com a saúde pública, falta de um planejamento urbano que oriente a construção das moradias – que são feitas de forma irregular –, exposição a doenças e poluição de vias expressas, poucas áreas verdes, falta de opções de lazer, como praças e parques, difícil acesso a outros espaços da cidade, grande tempo de deslocamento, falta de coleta de lixo, difícil acesso à alimentação de qualidade, entre muitos outros desafios.

Natural do Ceará e criada na Maré desde os dois anos, Maria comenta que, por conta de todas essas “faltas”, a população periférica “aprende a se virar”, com suas formas próprias de sobreviver e celebrar. Assim, a social media reforça a importância de as periferias terem um espaço na elaboração de soluções, uma vez que suas vozes devem ser ouvidas.

Maria Ribeiro. Foto: arquivo pessoal

Renato Pequeno, da UFC, cita outro exemplo que prova que as populações locais conhecem suas demandas melhor do que ninguém. Foi a partir de um processo de mapeamento de potências das periferias, realizado no âmbito do Observatório das Metrópoles nas Eleições: outro futuro é possível, em articulação com a Secretaria Nacional de Periferias (SNP), do Ministério das Cidades, que o núcleo de Fortaleza, do qual Renato faz parte, conheceu a experiência das cozinhas solidárias.

Ele também cita o programa Mães Crecheiras, que conheceu quando visitou a favela Monte Azul, localizada na região do Campo Limpo, na zona Sul de São Paulo. A iniciativa oferece formação para as chamadas “mães crecheiras” para que elas recebam um salário para ficar com as crianças de sua rua enquanto as outras mães vão trabalhar. “Esse tipo de alternativa vai emergir da necessidade que os grupos estão passando. E cabe ao Estado saber captar isso e disseminar como política pública.”

Na 8ª edição da Revista Casa Comum, Tiaraju Pablo D’Andrea, professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenador do CEP (Centro de Estudos Periféricos), produziu um artigo sobre “A urgência da pauta ambiental nas periferias urbanas”.

Acesse o texto completo em: bit.ly/EmPerspectiva8ed

Observatório das Metrópoles nas Eleições: um outro futuro é possível

Iniciativa do Observatório das Metrópoles, um Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT), conduzido pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTIC), o Observatório das Metrópoles nas Eleições: um outro futuro é possível tem como objetivo incidir na agenda pública em um ano eleitoral como 2024. Ao todo, serão elaborados 240 artigos de opinião por pesquisadores(as) dos 18 núcleos regionais sobre temas como: Segregação Urbana e Desigualdades; Governança Metropolitana; Gestão Democrática e Participação Cidadã; Ilegalismos e Serviços Urbanos; entre outros.

>> Conheça: www.observatoriodasmetropoles.net.br

Horta em Ocupação 8 de Março, localizada no bairro de Boa Viagem, zona Sul do Recife (PE). Foto: Sarah Vidal/FASE – PE

Agricultura nas cidades e segurança alimentar

Outra pauta fundamental dentro das muitas temáticas no cenário urbano é a alimentação. Direito à cidade e soberania alimentar são duas das quatro causas de atuação da FASE – Solidariedade e Educação, organização fundada em 1961 com foco em desenvolvimento local, comunitário e associativo.

“Colocamos no centro [de nossa atuação] o fortalecimento sociopolítico dos sujeitos coletivos periféricos sobre a prática e a incidência ao direito à alimentação saudável e acesso a áreas agricultáveis, podendo decidir sobre o que e como cultivar. Assim, ajudamos a recuperar os saberes populares ancestrais por meio da agroecologia, em contraposição ao modelo hegemônico de se relacionar com os recursos naturais e a produção de alimentos que, comprovadamente, impactam no aquecimento global e nas mudanças climáticas”, explica Luiza de Marillac Melo, coordenadora da FASE Pernambuco.

Luiza de Marillac Melo. Foto: Rebecka Santos/FASE – PE

Atuações como a da FASE Pernambuco ganham ainda mais importância ao se considerar o cenário da fome e insegurança alimentar no Brasil. Segundo análise do Instituto Fome Zero, houve uma redução do número de pessoas em situação de insegurança alimentar grave: de 33 milhões, no primeiro trimestre de 2022, para 20 milhões, no quarto trimestre de 2023.

Para colocar em prática o fortalecimento sociopolítico ao qual Luiza se refere, a FASE atua com comunidades do Recife com um objetivo múltiplo: discutir a segurança e soberania alimentar a partir de uma prática agroecológica, fortalecer o senso de comunidade e empoderar mulheres. É o caso da experiência em Ilha de Deus, uma Zona Especial de Interesse Social (ZEIS), na zona Sul da capital que, recentemente, recebeu sua primeira horta comunitária construída por mulheres periféricas a partir do projeto Fortalecendo Mulheres e Suas Práticas Coletivas de Direito à Cidade com Justiça Socioambiental, desenvolvido pela FASE com apoio de Misereor, organização alemã da igreja católica.

Além de todos esses benefícios, investir em espaços urbanos destinados à agricultura também traz vantagens ao meio ambiente. Segundo a Organização das Nações Unidas (ONU), a adoção de práticas agroecológicas fortalece a resiliência climática, podendo resfriar 0,2 graus na temperatura das cidades, além de outros aspectos, como a geração de emprego e renda e a redução das emissões com transporte.

Apesar dessas iniciativas, Luiza pontua que a FASE demanda a centralidade do Estado na agenda, considerando que a fome é um dado estrutural da realidade urbana brasileira, especialmente das periferias. “Para nós, não se combate a fome e nem se enfrenta o problema nutricional das cidades com o consumo de alimentos multiprocessados – muitos dos quais ainda são dominantes na tabela nutricional da merenda escolar pública. A fome e a segurança nutricional dependem essencialmente da produção de alimentos de verdade, agroecológicos e diversos, o que difere da visão predatória que tem o agronegócio, que envolve desmatamento, agrotóxico e monocultura.”

A 3ª edição da Revista Casa Comum teve como pauta central o tema “Há espaço para uma nova economia brasileira?”, assunto fundamental para repensar as cidades a partir de economias transformadoras. Na ocasião, Sandra Quintela, economista, educadora popular, articuladora da Rede Jubileu Sul [jubileusul.org.br] e presidenta do Instituto Políticas Alternativas para o Cone Sul (Pacs) [pacs.org.br], destacou que, ao pensar um modelo econômico que visa colocar uma vida plena, vida digna, no centro, “é preciso questionar o mercado e o financiamento, as formas de produção do capitalismo que considera apenas o valor de troca e não o que tem valor de uso, como o trabalho de cuidado doméstico, o trabalho de manutenção das relações sociais, que faz parte da construção da teia da vida, e sem a teia da vida não há economia.”

Confira a edição na íntegra: bit.ly/CasaComum_3ed

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