Publicado em
19/06/2024
Vozes em Ação da 9ª edição apresenta as histórias de Janvita Ribeiro e Ivan Baron.
Por Isadora Morena
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Experimentar a cidade pela arte: Janvita Ribeiro, artista e produtora, defende políticas de acesso à cultura para todos
Janvita Ribeiro. Foto: Alan Rodrigues
Janvita Ribeiro é uma jovem potiguar de 28 anos, formada em Publicidade e Propaganda e mestra pelo Programa de Gestão e Inovação em Saúde, ambos pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Porém, é como realizadora cultural, DJ e artista em múltiplas linguagens que ela se identifica, articulando diversas cenas culturais na cidade de Natal, em especial às conectadas à comunidade LGBTQIA+.
Mulher trans, Janvita conta como ocupar a cidade a fez reconhecer a si mesma, o que foi essencial no processo de construção de sua identidade.
Vinda de uma família tradicional, com pai militar e mãe enfermeira, ela teve uma infância cheia de restrições. “Eu sempre fui um corpo, uma pessoa muito à flor da pele a nível de tudo, de comportamentos, de gostos e de trejeitos. Então, acho que isso sempre foi algo rastreado pela minha família de uma maneira que foi muito sintomática para eu ter tido uma criação realmente bem reservada”, relata.
Isso começa a mudar no final do período escolar, quando ela passa a “experimentar a cidade e as suas possibilidades enquanto cultura, diversão, entretenimento e lazer”, afirma. Esse processo se consolida na universidade, quando Janvita se depara com realidades muito diferentes da sua, uma verdadeira “universidade de pessoas, incidências e vivências”, como ela conta.
Apaixonada pelos elementos da cultura pop, em especial o reality show “RuPaul’s Drag Race”, programa televisivo que exibe um concurso de artistas que disputam o título de Drag Queen Superstar, Janvita passa a se aproximar da cultura Ballroom* local e a performar como Drag Queen na cidade.
*Ballroom é um movimento político e de entretenimento, surgido nos Estados Unidos no final do século XIX, que visava o fortalecimento da diversidade de sexualidade, gênero e raça com a criação de concursos de beleza voltados para drag queens e pessoas trans, além de outras expressões culturais.
“Foi em um evento na Ribeira [bairro histórico de Natal] que eu performei como Drag pela primeira vez. Naquele instante aconteceu uma identificação nata, uma percepção de que eu já existia nesse lugar e não sabia. Quando chego nesse espaço, ali na Ribeira, com performance Drag e house music, com pessoas cantando e se divertindo, eu me encontro em casa. E a partir desse momento, é uma história que não terminou ainda.”
De Drag e DJ, ela passa a produzir seus próprios eventos, até virar sócia de um clube noturno chamado Frisson. O espaço cultural, criado em março de 2024, funciona na mesma Ribeira que a lançou e a fez se entender como pessoa trans. Apesar de a casa lotar e já ser referência na cidade, Janvita enfatiza a dificuldade que é produzir arte e entretenimento dissidente devido ao preconceito da sociedade, assim como o abandono do poder público tanto do bairro em si quanto do próprio setor cultural.
“Hoje, infelizmente, a gente ainda vê a questão das redes colonialistas, uma classe política que constrói uma cidade para si, enraizada nesse colonialismo. É uma cidade que, quando se readequa, o faz para a elite, não para os populares. É uma cidade que, quando a gente pensa em investimento para a cultura, é um investimento burocrático”, enfatiza.
A falta de políticas públicas de promoção e acesso, segundo ela, tem levado a população a consumir cultura de forma massiva pela Internet. Para Janvita, “é indispensável que a gente volte a acessar a cultura de maneira presencial e humana, a partir do olhar, do toque, da aula, de uma pessoa na frente, da oficina. Isso é uma vivência que nunca tem que deixar de existir.”
Janvita defende que é preciso batalhar sempre pela cultura viva, que movimenta a cidade, que a faz se deslocar. “A minha ferramenta, a minha arma, é através da cultura”, afirma.
No site da Revista Casa Comum, a matéria “Cidades vivas: a cultura como expressão do bem comum”, traz novas reflexões sobre as políticas culturais no âmbito dos territórios.
>> Confira em: bit.ly/CulturaEBemViver
Uma cidade em que ninguém fique para trás: Ivan Baron luta por inclusão plena
Fazer com que as pessoas com deficiência (PCDs) possam ter a liberdade de sair de suas casas e ocupar as cidades é uma das principais bandeiras de luta de Ivan Baron, outro jovem potiguar, de 25 anos, muito conhecido nas redes sociais como influenciador digital e também por ter subido a rampa do Palácio do Planalto junto à Lula em sua posse como presidente, em janeiro de 2023.
Conhecido como o “influenciador da inclusão”, Ivan tem mais de 500 mil seguidores no seu perfil do Instagram, onde discute as necessidades das pessoas com deficiência, denunciando ações preconceituosas e propondo uma real integração na sociedade dessa população.
Baron é também pedagogo e uma pessoa com deficiência. “Tenho paralisia cerebral, que apesar do nome, nunca me paralisou. Muito pelo contrário, é um dos maiores combustíveis para continuar nessa luta por sobrevivência, por contar nossas vivências, principalmente nos tempos atuais em que a sociedade é tão capacitista”, afirma o influenciador.
Ivan Baron. Foto: Raíssa Nayama
Sobre poder viver a cidade e suas múltiplas possibilidades, Ivan propõe um desafio: “dê um rolé com uma pessoa com deficiência no seu município. Independente de qual seja a deficiência, aí você vai estabelecer mais ou menos como é essa relação. Por que eu digo isso? Na maioria das vezes, eu saio com pessoas sem deficiência. Então, é uma saída solidária. Em que sentido? Ao chegar em um ambiente, não vejo pessoas como eu ocupando aquele espaço. E cabe uma reflexão: por que pessoas com deficiência não estão saindo de casa? Será que é porque elas preferem ficar trancadas nos seus quartos? Não. É porque a cidade de fato não é acessível.”
Segundo Ivan, a acessibilidade vai muito além de uma rampa ou de um elevador. “É preciso a acessibilidade comunicacional. Será que os espaços de lazer hoje em dia têm intérpretes de libras, audiodescrição, uma comunicação de fácil acesso a quem precisa? Será que quando essas pessoas saírem de casa, elas não vão ser julgadas pelos seus corpos, pela maneira como se expressam? Isso é acessibilidade, que cabe justamente ao poder público.”
Para ele, é papel da sociedade civil se conscientizar e começar a questionar, por exemplo, o que se entende como diversidade.
“Vejo muito uma diversidade seletiva que precisa acabar. Não adianta a gente pregar mais liberdade à população LGBTQIA+, mais respeito às mulheres, lutar contra o racismo e não incluir também PCDs, porque as pessoas com deficiência são mulheres, LGBTQIA+, pretos e pretas, indígenas. Então, nossa população está em todos os setores, mas, ao mesmo tempo, existem enormes barreiras para que ela não tenha liberdade e não participe de forma ativa.”
Ivan defende que a acessibilidade deve estar em primeiro plano e não ser enxergada como um gasto a mais. “Também é preciso parar de associar a acessibilidade apenas a pessoas com deficiência. A acessibilidade é para todo mundo, é universal. Se estou incluído, você com certeza também vai estar”, afirma o pedagogo.
Para ele, Bem Viver nas cidades é sobre pessoas não ficarem para trás. “Em uma sociedade capacitista, você ter o direito de sair de casa já é um privilégio. Para nós, por exemplo, que temos mobilidade reduzida, precisamos de uma rede de apoio. Acredito que o Bem Viver da pessoa com deficiência é ter mais autonomia. Não independência, porque independência e autonomia são conceitos diferentes. Independência é você não precisar de ninguém. Já a autonomia não. É você ter o direito de ir e vir e ter o apoio necessário para isso. Isso inclui outras pessoas. Eu não sou uma pessoa independente 100%, porque preciso do apoio de recursos humanos e de recursos físicos para me locomover. Mas eu vejo que a gente precisa de mais autonomia”, defende.
Ivan afirma que “a sociedade deve se conscientizar de que quem tem uma deficiência não é alguém incapaz ou inválido, mas que pode contribuir muito para a sociedade da sua maneira, de acordo com as suas adaptações.” Para ele, não há inclusão sem discussão política.
“Não tem como eu falar de inclusão, luta anticapacitista, mais acessibilidade, se eu não for um ser político. E, quando eu falo em política, não é uma questão sobre o partido A ou B, mas é discutir políticas públicas. É começar a ver quem de fato está no Legislativo ou no Executivo que levante minhas bandeiras. Porque, fora dessa política, só existe o autoritarismo, o negacionismo, capacitismo e tantas outras opressões que a gente nunca vai conseguir dar jeito se não for por meio do diálogo e, até mesmo, nos impondo como cidadãos e cidadãs”, finaliza.
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