Publicado em
20/06/2024
Nunca se falou tanto em velhice, amadurecimento e longevidade. Então, o velho está na moda? Não exatamente. Mas os números estão aí para atestar a teoria: a população mundial está envelhecendo. E mais rapidamente do que no passado.
Por Claudia Lima*
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Nunca um ditado fez tanto sentido quanto o famoso “A idade chega pra todos”. Quando a gente é jovem, fora momentos em que fazemos aquelas projeções futurísticas do tipo “o que eu estarei fazendo quando tiver 30 anos”, a gente nunca pensa em maturidade até que começa a perceber que não consegue mais ler com a mesma facilidade de antes. Ou, no caso das mulheres, no fatídico momento do fim da menstruação. Ou, de maneira reveladora, quando precisa visitar um geriatra.
O fato é que, apesar de o mundo ainda valorizar a juventude como o maior bem de todos, nunca se falou tanto em velhice, amadurecimento e longevidade. Nas revistas, na internet, nos programas de TV, nos podcasts. Então, o velho está na moda? Não exatamente. Mas os números estão aí para atestar a teoria: a população mundial está envelhecendo. E mais rapidamente do que no passado.
Inclusive, enquanto escrevo esse texto, dou de cara com a notícia de Dona Dorothi, uma pernambucana de 90 anos que se formou em direito, em 2023, e acaba de entrar na faculdade de jornalismo. Também penso em Zezé Motta, para mim o maior exemplo de que idade é só um número: ampliou seu horizonte profissional explorando ainda mais seu lado cantora e, aos mais de 70 anos, reinventou uma carreira exemplar tornando-se garota propaganda e criadora de conteúdo.
Ilustração: Clarissa Monteiro
Referências como essas mostram que a revolução está apenas começando. Segundo relatório do Fundo de População das Nações Unidas, a cada segundo, duas pessoas completam 60 anos no mundo, o que dá quase 58 milhões de pessoas por ano. E, até 2050, estima-se que uma a cada cinco pessoas estará completando seu 60º aniversário.
No Brasil, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) revelou que, em dez anos, o número de pessoas acima dos 60 anos passou de 11,3% para 14,7% da população, um aumento de cerca de nove milhões de idosos. Mas será que a sociedade está preparada para essa realidade?
Se formos falar do ponto de vista das mulheres da minha geração, nascidas nos anos 1970 e que, portanto, estão hoje na casa dos 50, a resposta ainda não é das mais animadoras. Essa talvez seja a primeira geração que chega aos 50 anos tirando o envelhecimento do armário, provando que idade não tem cara definida e muito menos motivo de vergonha. E que também está aprendendo que, para ter uma velhice de qualidade, a hora de se cuidar é agora. E mais: tirando, de baixo do tapete, assuntos que, por muito tempo, foram considerados tabu.
Nunca se falou tanto, por exemplo, sobre menopausa, que é o dia em que se completa um ano sem menstruar e que marca o final da fase reprodutiva, hoje discutida mais abertamente, buscando acabar com todos os estigmas cultivados por décadas. Segundo o estudo A Demografia da Menopausa, realizado em 1996, cerca de 25 milhões de mulheres no mundo passam pela menopausa todos os anos e, até 2030, esse número deve ultrapassar 1,2 bilhão.
Sim, a menopausa é pop e está em todo lugar – na internet, nos filmes, nas revistas e até na boca das famosas. Mas há ainda muita desinformação, inclusive de parte da classe médica. E, como mulher preta, não posso deixar de observar que, nesse sentido, não há um olhar inclusivo para nós e, também, para as mulheres periféricas.
É urgente que se criem políticas públicas que levem informação, envolvam diagnóstico e deem acesso a tratamento para todas as mulheres, incluindo também aquelas em vulnerabilidade social e que, por conta de uma dura realidade, passam pela menopausa sem conhecimento, com sofrimento e achando, sim, que a vida acabou. Algumas providências para isso já vêm sendo tomadas. Em março, a Comissão de Direitos Humanos (CDH) aprovou um projeto de lei que visa proporcionar tratamento para mulheres em climatério e menopausa pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Ao contrário de anos atrás, quando ter meio século era estar cada vez mais perto da aposentadoria, o processo de amadurecimento vem sofrendo transformações nítidas. Pessoas de 50 e 60 anos estão no auge, tanto na postura, quanto na atitude e na capacidade física e intelectual. E isso se reflete no mercado de trabalho. Maduros que hoje têm 50 anos ou mais continuam produzindo e tocando suas carreiras como sempre estiveram e nem pensam em deixar o mercado de trabalho, muito pelo contrário.
Mas será que as organizações estão prontas para reter e absorver esses profissionais? É preciso que se criem mecanismos para reter e contratar profissionais mais velhos que podem continuar exercendo suas funções como trazendo toda uma bagagem de experiência que proporciona uma troca intergeracional incrível.
O fato é que a mudança na expectativa de vida é um fenômeno que precisa de uma transformação urgente na sociedade. Se vamos viver mais, precisamos viver melhor.
É urgente que as pessoas também tenham mais acesso à cultura, ao lazer e à mobilidade urbana. Precisamos de condições para circular pela cidade com mais segurança, o que significa andar em calçada niveladas e seguras para todos que transitam pelas vias públicas.
Em resumo, jovens e velhos, poder público e cidadãos precisam pensar na velhice como a construção do Bem Viver de uma etapa da vida na qual todos iremos passar. Como diriam os Racionais, “o barato é louco e o processo é lento”. Mas estamos aqui pela mudança que, com sorte, todos estaremos aqui para ver.
Saiba mais
*Claudia Lima é jornalista. Atua como editora, roteirista e apresentadora, além de ser colunista da Revista Vogue, com foco em temáticas dedicadas às mulheres maduras. Também é colaboradora do site Mina Bem-Estar. Foi roteirista do podcast Vogue Sua Idade, entre outras produções, e é uma das autoras de “Maria Glória do Brasil”, livro em homenagem à jornalista Glória Maria.
Elas estão na linha de frente de diferentes iniciativas que buscam o bem comum em seus territórios.
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