Publicado em
05/12/2024
Apesar de avanços legislativos, as eleições de 2024 evidenciaram que mulheres e pessoas negras seguem enfrentando barreiras estruturais, financeiras e institucionais para alcançar representatividade proporcional na política brasileira.
Por Douglas Rocha Almeida e Victória de Moura Trindade, analistas políticos da Pulso Público
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A política brasileira precisa avançar na promoção de equidade de gênero e raça, já que candidaturas femininas enfrentam desafios como violência de gênero e o descumprimento das cotas estabelecidas pela Justiça Eleitoral.
Há, ainda, obstáculos financeiros, institucionais e subjetivos para a eleição de pessoas negras, evidenciados pela predominância de candidatos brancos.
Em outubro de 2024, o Brasil ocupava a 135ª posição no ranking mensal da União Interparlamentar – UIP (2024), que avalia a presença de mulheres nos parlamentos nacionais em 193 países. Apesar de não avaliar a representação nos níveis estaduais e municipais, o ranking expõe a permanente sub-representação das mulheres no Poder Legislativo brasileiro.
Leis e resoluções
Visando mitigar essa sub-representação, têm sido criadas, no Legislativo e no Judiciário, normas que aumentem a representação política de mulheres, e mais recentemente, de pessoas negras.
Entre essas medidas, é possível destacar cinco essenciais:
1. A Lei 9.100/1995, que estabeleceu a reserva mínima de 20% de candidaturas femininas por cada partido ou coligação nas eleições municipais;
2. A Lei das Eleições (Lei 9.504/1997), que estabelece o preenchimento mínimo de 30% e máximo de 70% para candidaturas de cada sexo por partido ou coligação em eleições municipais e federais;
3. A Resolução TSE 23.607/2019, que estabelece a destinação do mínimo de 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC) dos partidos políticos para as candidaturas femininas;
4. A Resolução 23.665/2021, que inclui cotas do fundo para candidaturas de pessoas negras de forma proporcional ao gênero e raça; e
5. A Emenda Constitucional 117/2022, que estabelece a destinação mínima de 30% do FEFC, do fundo partidário e do tempo de propaganda gratuita para as candidaturas femininas.
Desafios permanecem
Apesar das leis, resoluções, Emendas Constitucionais e Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) que completam quase 30 anos na política brasileira, a sub-representação de mulheres e pessoas negras permanece, possibilitadas pela impunidade diante das leis e pelas fraudes eleitorais, sendo os partidos políticos constantemente anistiados pelo descumprimento da cota de 30% de candidaturas femininas e da utilização do fundo partidário para promoção da participação política de mulheres.
De acordo com a Secretaria da Mulher (2024) da Câmara dos Deputados, a cota de gênero do mínimo de 30% de candidaturas femininas foi descumprida em mais de 700 municípios por 26 partidos diferentes nas eleições de 2024.
Em função do descumprimento, a proporção de mulheres candidatas para as Câmaras Municipais não apresentou avanços entre 2020 e 2024, representando 34% das candidaturas, com as mulheres negras ocupando pela primeira vez mais da metade das candidaturas femininas, sendo 18% de mulheres negras e 16% de mulheres brancas. Já nas prefeituras, as candidaturas de mulheres foram bastante reduzidas, com apenas 6% negras e 9% brancas, representando apenas 15% das candidaturas totais (Rocha; Sacagami, 2024).
Em relação às mulheres eleitas, essa porcentagem é muito menor e não se aproxima dos patamares estabelecidos pela Lei das Eleições. Apenas 13% dos prefeitos eleitos em 1° turno são mulheres, sendo 9% mulheres brancas e 4% mulheres negras (Rocha; Sacagami, 2024). Já em 2° turno, foram eleitas apenas 5 mulheres (9,8%) para as 51 prefeituras, sendo 4 mulheres brancas (7,8%) e 1 mulher negra (2%).
Nas Câmaras Municipais, apenas 7% das cadeiras serão ocupadas por mulheres negras e 11% por mulheres brancas a partir de 2025, totalizando 18% dos vereadores brasileiros.
As mulheres indígenas e amarelas em ambos os cargos representam cerca de 0,1% das cadeiras, sofrendo ainda mais com a sub-representação política (Rocha; Sacagami; Ferrari, 2024).
O desempenho de pessoas negras nas eleições municipais de 2024 foi igualmente desanimador. Mesmo negros e negras sendo a principal massa populacional, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), das 26 capitais brasileiras, apenas seis elegeram prefeitos negros, todos homens, pardos e de centro ou de direita. E quatro dessas seis pessoas eleitas não mobilizaram pautas raciais em suas propostas de governo.
As capitais Rio Branco e Maceió elegeram prefeitos do PL, nenhum deles com políticas públicas voltadas a questões raciais. O MDB também elegeu dois candidatos negros para capitais e, enquanto o prefeito eleito de Boa Vista não apresentou políticas para negros, o de Porto Alegre mencionou o Museu do Negro e a inclusão social de pessoas negras.
Reeleito, o prefeito de Manaus, do Avante, não detalha políticas raciais em seu programa. Em João Pessoa, Cícero Lucena, do PP, é exceção, prometendo valorizar artistas negros, fomentar a política de cotas e lançar um edital que cria o selo “Empresa Pró-Equidade de Gênero e Raça”.
Para além das capitais, há avanço em relação a anos anteriores, embora os dados também sejam ruins. Em 2025, 1.850 prefeitos negros assumirão o cargo, representando 33,5% dos eleitos, 57 a mais que na eleição anterior. Desses, 127 se declararam pretos e 1.723, pardos. Além disso, a eleição de 2024 foi a segunda consecutiva com mais candidatos negros do que brancos, o que pode ser motivado pelas políticas de cotas.
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