Publicado em
25/06/2025
Plebiscito busca garantir o direito ao trabalho digno, com jornadas que privilegiem o descanso, a convivência familiar e comunitária e dizer não ao lucro e à exploração do trabalho.
Por Rosilene Wansetto
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Neste ano de 2025, está em curso um processo político pedagógico que chamamos de plebiscito popular. Já ficou demonstrado, ao longo desses 25 anos, o quão poderosa e importante é essa metodologia e ferramenta. É um instrumento de diálogo com o povo e desde o povo: nas comunidades, no local de trabalho, na rua, no transporte público, que contribuiu na pressão política sobre os centros de poder e de tomada de decisão.
Os plebiscitos populares possibilitam o fortalecimento da democracia e da soberania popular, assim como processo mobilizador e de formação, que pode alcançar resultados para além das ações temporais relacionadas à realização dos mesmos. Além disso, contribuem na educação popular de lideranças para atuação em horizontes futuros e nos espaços de organização da sociedade civil, instituições e movimentos sociais, populares, feministas, sindicais, religiosos, entre outros pelo país adentro.
O plebiscito deste ano reforça todos os plebiscitos organizados anteriormente. As experiências deixaram aprendizados que potencializam esse novo momento político e histórico, uma consulta popular que toca direto na vida cotidiana das famílias brasileiras. Esse processo que está sendo construído em mutirão vem carregado de elementos que tratam da dignidade dos(as) trabalhadores(as) e o direito humano a ter uma vida com equidade, com direito ao descanso, com uma jornada de trabalho digna, assim como busca incentivar o debate e uma mudança na promoção da justiça social e tributária que se traduz em reparação social, onde a desigualdade pode ser enfrentada de maneira concreta com distribuição de renda. Fazer valer a máxima de quem ganha mais paga mais.
Esse processo – já iniciado – tem por objetivo jogar luz sobre três temas centrais e importantes: redução da jornada de trabalho sem redução salarial; o fim da escala 6×1; redução do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais e taxação para quem ganha acima de R$ 50 mil mensal. Essas questões têm a ver com a justiça social, tributária e trabalhista. Ou seja, garantir o direito ao trabalho digno, com jornadas que privilegiem o descanso, a convivência familiar e comunitária e não o lucro e acumulação de alguns poucos, da classe rica, dos especuladores e que vivem da exploração do trabalho.
Queremos viver! Vida além do trabalho! Produzir justiça tributária é cobrar imposto de quem ganha mais, o que leva à justiça social. A [lógica da] distribuição de renda: quem ganha mais, paga mais.
Entendemos que são medidas fundamentais e inclusivas para os(as) trabalhadores(as) que estão na informalidade, pois reduzir a escala de trabalho, hoje conhecida como 6×1, abre possibilidade de incluir mais pessoas no mundo do trabalho, abrindo novos postos e retirando da informalidade a grande massa de trabalhadores precarizados, uberizados, sem direitos, com jornadas exaustivas e sem nenhum direito.
E dialogar sobre justiça social, sobre uma jornada de trabalho equitativa, justa e com direitos trabalhistas, com essas mudanças o país não vai quebrar, como muitos nos querem fazer acreditar. Vai, sim, gerar mais inclusão, dignidade e distribuição de renda.
A segunda pergunta do plebiscito, sobre a redução do imposto de renda para quem ganha até R$ 5 mil mensais, é fundamental para desonerar o(a) trabalhador(a).
Hoje, a carga tributária pesa mais sobre quem ganha menos. Quem ganha mais, paga menos, porque a tabela do Imposto de Renda não leva em conta as desigualdades imprimidas pelo atual sistema tributário. Essa proposta inverterá a lógica atual de que quem ganha menos proporcionalmente paga mais. Essa mudança no imposto de renda será fundamental para gerar distribuição de renda.
Em resumo, o plebiscito popular deste ano busca esse diálogo estruturante que é a justiça social a partir da justiça tributária, revisando a tributação do imposto de renda, tão urgente e necessária, além de uma jornada de trabalho digna para todos(as).
Por isso, propomos que, nos mais diferentes espaços, possamos motivar esse debate sobre o plebiscito popular: em reuniões, formações, assembleias, coordenações, direções e juntos, juntas e juntes, construir essa luta de forma unitária, num grande mutirão.
Para isso, propomos debater duas perguntas:
1. Você é a favor da redução da jornada de trabalho sem redução salarial, e do fim da escala 6×1?
2. Você é a favor que quem ganha mais de 50 mil pague mais imposto, para que quem recebe até 5 mil não pague imposto de renda?
Nos plebiscitos anteriores tínhamos um contexto político, econômico e social muito diferente do que vivemos hoje. No início dos anos 2000, estávamos em um grande ascenso das lutas e da organização popular. Hoje estamos numa grande retração e, por isso, o plebiscito se torna ferramenta ainda mais importante e central para que retomemos com mais força as articulações para o enfrentamento à extrema direita, que segue com seus intentos de tomar o poder, promovendo golpes e desrespeitando os processos políticos democráticos e eleitoral de nosso país.
Para participar no seu estado, região ou município, acesse o site do plebiscito – https://plebiscitopopular.org.br/ – que conta com uma série de informações, assim como materiais formativos para dialogar no seu local de trabalho, no ônibus, no metrô. Esse é o desafio: fazer o plebiscito acontecer onde você estiver.
O período de coleta de votos tem início em julho.
Todas as informações estarão no site ou nas redes sociais do plebiscito. Acompanhe!
Para saber mais sobre os plebiscitos anteriores
Em nossa Constituição Federal, no Artigo 14º, há a previsão de realização de plebiscitos, referendos e iniciativa popular de lei para o pleno exercício da soberania.
Esses mecanismos de participação popular são regulamentados pela Lei nº 9.709/1998, que estabelece os critérios para a convocação. Já tivemos plebiscitos convocados pelo Congresso Nacional, como o referendo sobre a proibição da comercialização de armas de fogo e munições, ocorrido no Brasil em 23 de outubro de 2005.
E, em 1993, foi realizado um plebiscito nacional para definir sobre República ou Monarquia e entre presidencialismo ou parlamentarismo como sistema de governo a ser adotado no Brasil. Isso é pouco em comparação a outros países que adotam essa forma de consulta como um elemento forte de governar com o povo e não para o povo.
Partindo dessa premissa de legislar com o povo e por meio da democracia direta, os plebiscitos no Brasil, conforme rege nossa Constituição, poderiam ser um elemento fortalecedor da soberania popular, porém pouco usados mesmo em governos democráticos populares ou progressistas. Alguns estados brasileiros têm usado mais esse instrumento de participação direta, mas muito aquém do que poderia ser.
Tendo em vista essa ferramenta forte de consulta e de diálogo com o povo, os movimentos sociais historicamente têm usado os plebiscitos populares. Tivemos cinco experiências de plebiscitos convocados e organizados pelos movimentos sociais e populares, sindicatos e organizações da sociedade civil, como instrumento importantíssimo para organizar o debate, a mobilização e participação direta sobre temas fundamentais para a sociedade brasileira.
O plebiscito popular é uma ferramenta para provocar o interesse da população por questões políticas e sociais, para fortalecer o exercício da democracia. Esta vertente da cidadania é um caminho promissor de reversão da alienação e de participação consciente no debate dos problemas nacionais. Ele carrega, sobretudo, um potencial positivo de prática democrática: não é imposto por nenhum movimento ou entidade, é assumido livremente e coletivamente, não é arbitrário, não se caracteriza por atitudes dogmáticas. Convida para o debate e para um posicionamento responsável e consciente.
É um instrumento de organização e luta, onde todas as forças populares se unem em sinergia, com foco único, com uma meta coletiva para atuar fortalecendo a participação em nosso país, rumo a um projeto popular verdadeiramente participativo, democrático, equitativo e justo. Além de ser uma ferramenta de luta, é um importante instrumento para a formação política.
É mais democrática uma sociedade que consulta a população sobre as questões que mexem diretamente com a vida de todas as pessoas. Hoje, as aprovações pelo Congresso são marcadas por negociatas, trocas de favores e privilégios, o que é configurado como crime. É por isso que devemos usar nossa voz e responsabilidade de cidadãs e cidadãos para fazer acontecer, de fato, a democracia em nosso país.
Experiências de plebiscitos populares nestes últimos 25 anos
No final dos anos de 1990, aconteceu o processo de organização do primeiro plebiscito popular. Foi impulsionado pela 3ª Semana Social Brasileira – 3ª SSB. Foi uma “semana de 3 anos”, de 1997 a 1999, que coincidiu com o tríduo da preparação ao Jubileu dos anos 2000, convocado pelo então Papa João Paulo II. Teve como temática o “perdão das dívidas”, e foi desse processo que se fortaleceu ao redor do mundo, especialmente do Sul global, a temática da “Campanha do Jubileu 2000 por um Milênio sem Dívidas”.
Nesse solo fértil e com o Tribunal da Dívida Externa (1999), realizou-se no ano 2000 o Plebiscito Popular sobre a Dívida Externa. Este plebiscito foi organizado por um conjunto de organizações, movimentos, pastorais, tais como Comissão Episcopal para Ação Sociotransformadora (Cepast/CNBB), Conselho Nacional das Igrejas Cristãs (CONIC), Coordenadoria Ecumênica de Serviço (CESE), Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Central dos Movimentos Populares (CMP), União Nacional dos Estudantes (UNE), IBRADES, Instituto Pacs, Cáritas Brasileira, Federação Sindical dos Engenheiros (FISENGE), Grito dos Excluídos/as Nacional, Articulação para o controle de Capitais (ATACC), e os partidos PT e PCdoB.
Todo processo foi organizado em conjunto com o Grito dos Excluídos/as e a concentração para a coleta de votos foi na Semana da Pátria, de 1º a 7 de setembro, especialmente no Dia da Independência. Assim se manteve no plebiscito da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), em 2002 e nos seguintes.
O segundo plebiscito popular, sobre a Alca – ALCA, foi organizado por um conjunto ainda mais diverso e expressivo de organizações e movimentos sociais, populares, feministas e sindicais, igrejas e coletivos. Nesta segunda consulta, se consolida o “plebiscito” como um instrumento de educação popular, organização e fortalecimento das lutas.
Os plebiscitos populares carregam uma característica importante de produzir materiais para o diálogo com os diferentes matizes sociais e, principalmente, para a educação popular através de cartilhas, vídeos, jornais, cartazes, uma infinidade de conteúdos formativos e pedagógicos que auxiliam na escuta e no diálogo para a mobilização.
Em 2007, foi realizado o terceiro plebiscito popular, sobre a privatização da empresa Vale – privatização esta realizada no governo Fernando Henrique Cardoso.
E, em 2010, realizou-se o quarto Plebiscito Popular Nacional pelo Limite da Propriedade da Terra.
Em 2013, mais uma vez nos juntamos na construção do quinto Plebiscito Popular por uma Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político. O objetivo era debater e construir força política para se ter uma Constituinte exclusiva que enfrentasse as mazelas do nosso sistema político: sub-representação das forças populares, especialmente mulheres, povo negro e indígena nos espaços de poder, e que, ao mesmo tempo, pudesse fazer frente ao poder econômico nas decisões públicas e elaborar um sistema que aponte para a construção do poder popular.
Todos os plebiscitos usaram uma metodologia construída coletivamente, pelos diversos territórios, nos estados e em todo o país, de forma horizontal, com a participação ativa de organizações populares do campo e da cidade, e com materiais de educação popular.
Os plebiscitos populares foram – e seguem sendo – valiosíssimos instrumentos político e pedagógico que contribuem na construção da unidade e processos, fortalecem as articulações e promovem a aproximação entre as organizações populares e a população não organizada. Contribuem para a formação, proporcionando espaço de estudos e organização, por meio dos processos locais, estaduais e nacionais, assim como contribuem na agitação e mobilização.
* Rosilene Wansetto, socióloga e Mestre em Ciência Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP), educadora popular e Secretária Executiva da Rede Jubileu Sul Brasil. Participa da Coordenação Executiva do Plebiscito Popular representando a Comissão Episcopal para a Ação Sociotransformadora da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (Cepast-CNBB), Jubileu Sul e Grito dos Excluídos/as.
Especialista do Inesc e da Plataforma dos Movimentos Sociais por outro Sistema Político defende a importância de a sociedade pensar, conjuntamente, em novas formas de democracia para que o Brasil avance enquanto país.
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