Publicado em
07/03/2023
O regime democrático brasileiro foi colocado em xeque quase que diariamente nos quatro últimos anos.
Por Elvis Marques
Atos golpistas no Palácio do Planalto. Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil
Com as eleições e a derrota de Jair Bolsonaro (PL), os ataques verbais e as fake news se transformaram em ações concretas: tentativa de explosão de uma bomba na região do aeroporto de Brasília, ônibus sendo jogado de viaduto e sedes do Judiciário, Executivo e Legislativo invadidas por fanáticos. E uma evidência grave: conivência de forças de segurança e agentes públicos com extremistas.
Desde a redemocratização, o Brasil nunca esteve tão próximo de uma série de tentativas de golpes de Estado, acompanhadas de minuta do ex-ministro da Justiça e da Segurança Pública, Anderson Torres, a qual trazia todos os elementos possíveis para a destituição de um governo eleito, até a invasão das sedes do Executivo, Legislativo e Judiciário, na Praça dos Três Poderes, em Brasília, no dia 8 de janeiro de 2023.
A série de atos terroristas partiram de bolsonaristas, principalmente aqueles acampados em frente à sede do Exército em Brasília desde o resultado do segundo turno das eleições brasileiras, que declararam Luiz Inácio Lula da Silva (PT) eleito para o seu terceiro mandato como presidente da República. Se somaram a esses golpistas, caravanas de inúmeros estados, principalmente de São Paulo, Minas Gerais, Santa Catarina, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paraná.
Breve cronologia dos últimos acontecimentos de cunho golpista na capital federal: Era noite do dia 12 de dezembro de 2022, após a diplomação do presidente Lula e do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), em Brasília. Fogo e fumaça para todo lado. Ruas e avenidas fechadas. Ônibus sendo empurrado do alto de um viaduto. Dezenas de carros e coletivos foram quebrados e incendiados. Ataques e tentativas de invasão ao edifício sede da Polícia Federal (PF). Quebradeira na 5ª Delegacia de Polícia Civil. Botijões de gás utilizados como barricadas. Comércios depredados. Bombas caseiras apreendidas. Pessoas feridas. Saiba mais Já na véspera de Natal, aconteceu algo inédito próximo ao Aeroporto Internacional de Brasília: tentativa de atentado a bomba junto a um caminhão-tanque carregado de querosene. Dinamites foram apreendidas pelo Esquadrão Antibombas. As polícias Civil e Federal foram acionadas. Integrante do acampamento golpista nas redondezas do QG do Exército, George Washington, foi o primeiro a ser autuado pelos crimes de terrorismo, posse e porte ilegal de arma de fogo de uso restrito. Saiba mais E no dia 8 de janeiro de 2023, uma semana após a cerimônia de posse de Lula e Alckmin, a Praça dos Três Poderes foi invadida por bolsonaristas em uma tentativa de golpe de Estado. Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal (STF) foram invadidos e totalmente depredados. Cerca de 1.200 pessoas foram detidas após a omissão e conivência de diversos agentes públicos, como policiais e militares, e o prejuízo com a quebradeira e furtos de peças de artes pode chegar a R$ 20 milhões, conforme levantamento da CNN Brasil com fontes do governo. Saiba mais Já no dia seguinte, as ruas do país se encheram de pessoas em protestos pró-democracia, em capitais como São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Vitória, Porto Alegre, Florianópolis, Goiânia, Belém, Vitória, Salvador, Fortaleza e Recife. Os manifestantes entoavam “sem anistia”, pedindo punição aos terroristas. |
Apontando que os ataques golpistas são de uma minoria extremista, uma pesquisa Datafolha divulgada no dia 11 de janeiro de 2023 aponta que 93% dos brasileiros condenam os atentados de bolsonaristas ao Congresso Nacional, STF e Palácio do Planalto.
Esse respaldo da maioria da população brasileira à democracia veio, de imediato, dos líderes mundiais dos EUA, França, Alemanha, Espanha, Chile, Argentina, China, Japão, Reino Unido, África, Rússia e tantos mais. A Organização das Nações Unidas (ONU) foi enfática ao defender a democracia do Brasil, a confiabilidade nas eleições e a manutenção da ordem pública.
No Brasil, os 27 governadores(as) [da situação e da oposição] foram até Brasília e se reuniram com os chefes dos três poderes. E, em uma imagem histórica, todos os principais chefes de poderes federais e estaduais desceram a rampa do Palácio do Planalto e caminharam até o local mais destruído pelos atos de vandalismo, a suprema corte.
Atos de vandalismo em Brasília. Foto: Marcelo Camargo / Agência Brasil
Radiografia do bolsonarismo Rudá Ricci, sociólogo e presidente do Instituto Cultiva, em entrevista à Revista Casa Comum antes das tentativas de golpe na capital federal, classificou as 58 milhões de pessoas que votaram em Jair Bolsonaro (PL) basicamente em três perfis: 1º grupo: é formado por pessoas que se definem como de direita, mas não são radicais. 2º grupo: é formado por pessoas de direita, radicais, mas não fanáticas. 3º grupo: é o mais perigoso, formado por cerca de 15 milhões de pessoas de extrema direita*. São radicais, fanáticas, sádicas e que criam idolatrias. Há a presença de ‘lobos solitários’ capazes de atos terroristas. As pessoas que têm participado dos atos golpistas em Brasília podem ser enquadradas neste agrupamento. *O Observatório da Extrema Direita (formado por acadêmicos de universidades do Brasil e de outros países) estima que 15% da população brasileira seja de extrema direita. |
O papel da comunicação no cenário de disputa do Estado
Para cada um desses grupos, Rudá aponta técnicas de comunicação que são utilizadas pela extrema direita, neste caso pelo bolsonarismo, para alimentar e “fidelizar” esses públicos. Uma das primeiras estratégias é delimitar e refinar o público, chegando em subgrupos, e buscar os seus interesses em comum, a partir de pesquisas na internet. Esse contato, posteriormente, passa a se dar via redes sociais ou por aplicativos de troca de mensagens, como WhatsApp e Telegram. Confira:
Metapolítica: aborda, com uma determinada massa, qualquer assunto que não seja sobre política, mas que é do seu interesse, e isso é baseado, sobretudo, nos algoritmos das redes sociais. Por exemplo, pessoas que gostam de carros. Em determinado momento esse assunto é vinculado com o de política. “Você viu o carro que o presidente X comprou? Quanto será que custa?” E assim entra o tema político de forma enviesada.
Pertencimento: outra tática é criar uma série de estímulos, principalmente para o Grupo 2, de modo que essas pessoas se sintam parte de um agrupamento para motivar o ideário do “nós contra eles” e alimentar esses seguidores com informações ao nível que cresça a tal rivalidade. Fazer parte de uma comunidade reforça o sentimento de legitimidade do grupo.
Apito de cachorro: o termo vem da expressão em inglês dog whistle, uma mensagem com um nível de codificação comunicada por meio de frases inteiras ou apenas algumas palavras aparentemente aleatórias que, geralmente, só pode ser compreendida por um grupo de pessoas, mas não por todo mundo.
Câmara de eco: esse é um procedimento voltado para os extremistas, no qual há o envio, incansavelmente, de múltiplas informações sobre determinado assunto. Esse grupo é bombardeado sobre a mesma pauta, sempre agregando informações novas. O objetivo desse método, destaca Rudá, é chegar a uma lavagem cerebral. É algo tão forte que qualquer informação contrária a essa dá a impressão que é falsa, como por exemplo as manifestações anti-vacina contra Covid-19 que foram questionadas apesar das inúmeras evidências que garantem sua efetividade.
Para chegar a esse ponto de controle social, os administradores de grupos utilizam fotos, imagens gráficas, vídeos, áudios, palestras, publicações, entre outros. A intenção é alicerçar o assunto de tal forma que seja quase impossível desmenti-lo.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil
Terrorismo Estocástico
De acordo com Rudá (foto ao lado), essas técnicas comunicacionais podem levar grupos ou indivíduos a cometer atos criminosos. “Estocástico é um estudo de probabilidade de uma ação gerar reações, porém não há um comando evidente sobre essas atitudes. A reação é aleatória, e não é possível saber onde e nem quando ocorrerá, já que não é ordenada de forma específica.” Como diz o ditado popular, quem incita essas pessoas “lava as mãos” caso aconteça algo grave. Um exemplo são os múltiplos atentandos no Distrito Federal.
Como são definidos esses movimentos?
Antes de esmiuçar termos que têm ganhando o debate político com maior frequência nos tempos recentes, como bolsonarismo e facismo, o sociólogo explica que diferente de outros regimes extremistas, o ex-presidente Bolsonaro não criou um partido de massas mobilizador ao longo da sua carreira política, sobretudo no período de campanha e de mandato presidencial. “Há elementos importantes para olharmos que surgem e dão características a esse movimento em pleno século XXI. O partido de massas dele são as redes sociais.”
Veja as definições desses movimentos, por Rudá Ricci:
Bolsonarismo: é uma articulação e movimento políticos de extrema direita fascista, sendo ultraliberal na economia. Se utiliza de ameaças e da violência contra qualquer oposição.
Fascismo: é um movimento totalitário de extrema direita, que não consegue, em primeiro lugar, admitir a existência de uma força contrária ao seu pensamento. Aqui o projeto político confunde a figura do líder carismático com a noção de nação, por isso seus apoiadores defendem que ser contra o governo é ser contra a nação, é não ser patriota. Uma confusão entre o líder político, a nação e o Estado. Daí decorre a ideia de que todos os poderes da República se subordinam à nação, e, portanto, ao Executivo. Nessa concepção, o Judiciário não poderia se posicionar contra o líder carismático.
Facismo diferente do nazismo: o facismo se mistura com outros ideários, desde que eles se subordinem ao facista, coisa que o nazismo não faz, pois é exclusivista.
Expoentes políticos da extrema direita no mundo [Itália] Giorgia Meloni, 45 anos, eleita em 2022 a primeira mulher premiê da Itália pelo partido Irmãos da Itália, herdeiro do líder fascista Benito Mussolini. Para liderar o país, ela formou uma aliança com partidos de extrema direita e centro direita. [Hungria] Viktor Orbán, 59 anos, chefia a Hungria desde 2010 e deve permanecer no cargo mais alto do país até 2026 pelo partido conservador Fidesz. Com um governo autodeclarado iliberal, o primeiro-ministro é tido como o líder global da extrema direita. [EUA] Donald Trump, 76 anos, é um empresário, ex-apresentador de TV e foi o 45º presidente eleito dos EUA pelo Partido Republicano. Em 2020, ao ser derrotado pelo democrata Joe Biden, se recusou a aceitar e lançou uma série de acusações infundadas contra o sistema eleitoral, o que contribuiu para inflar grupos extremistas a invadir o Capitólio, quando os congressistas estavam reunidos para oficializar o presidente eleito Biden. Cinco pessoas morreram, várias ficaram feridas e o parlamento foi amplamente destruído. Todavia, isso não impediu a diplomação do democrata. [França] Marine Le Pen, 54 anos, integra a Assembleia Nacional da França como deputada, e, de maneira recorrente nos últimos anos, tem disputado a presidência do país. Símbolo da direita radical francesa, ela é filha de Jean-Marie Le Pen, conhecido por minimizar o Holocausto, quando milhões de judeus foram mortos por nazistas. Em comum, essas figuras têm pautas baseadas na rejeição à União Europeia, nas políticas anti-imigração, na negação dos direitos da comunidade LGBTQIA+, redução dos direitos reprodutivos das mulheres, maior acesso às armas, hostilização da imprensa, e negacionismo, por exemplo, no campo da ciência. |
A importância de chegar ao poder
Rudá Ricci acredita que esses atos golpistas extremados devem continuar a acontecer, aliados ainda com greves de caminhoneiros, desabastecimento de alimentos nas cidades e conflitos de rua camuflados de manifestações.
“A gente não deve brincar com o bolsonarismo. Eles vão vir nas próximas eleições para fazer prefeitos, e, para isso acontecer, precisam instalar o caos no próximo semestre de 2023, porque é só fazendo essas confusões que o bolsonarismo pode eleger muitos prefeitos, o que, depois, pode ajudar o ex-presidente e seus aliados em seu projeto de poder.”
Desmontagem do acampamento de bolsonaristas em frente ao Palácio Duque de Caxias, sede do Comando Militar do Leste do Exército Brasileiro. Foto: Fernando Frazão / Agência Brasil
O especialista explica que o foco nas eleições municipais deve se dar pois esses são importantes cabos eleitorais para deputados estaduais, federais, senadores, governadores e presidente, já visando 2026.
“O que ficou claro para Bolsonaro é que a dependência dele do Centrão, que tem haver com o número de prefeitos, gerou uma debilidade, inclusive eleitoral, e a possibilidade de ter um bolsonarismo raiz é se ele romper com o Centrão, e para isso ele precisa fazer prefeitos e, consequentemente, aumentar a capilaridade de sua base. Eles vão vir com tudo nas próximas eleições”, acredita o sociólogo.
As urgências que não podem esperar Ao falar na reconstrução do país, o professor Rudá aponta nove campos que deveriam ser prioritários durante o mandato do novo Governo Federal: 1. Extinção do Teto de Gastos Públicos (Proposta de Emenda Constitucional – PEC 55); 2. O auxílio social: combate à fome, acolhimento e convívio social; 3. Vacinação em massa, com regularidade e orientação social; 4. Trabalho, emprego e renda com estabilidade; 5. Repensar o modelo produtivo: não basta ser “campeão do agronegócio”; 6. Conservação do meio ambiente e a nova matriz energética; 7. Política externa: o Brasil volta a ser “player” mundial; 8. Aprofundar o SUS e integrar com o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), Sistema Nacional de Educação e Previdência; 9. A disputa dos valores sociais: uma rede de escolas da cidadania e Orçamento Participativo Federal. |
Um país em reconstrução passa pela educação
Denise Carreira, professora da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), fundadora da Coalizão Direitos Valem Mais: pelo fim do Teto de Gastos e por uma nova Economia e da Articulação contra o Ultraconservadorismo na Educação, analisa que a educação foi uma das áreas prioritárias nos ataques de grupos autoritários e do último governo, “que sequestraram o Estado brasileiro nos últimos anos.”
>> Conheça a Coalizão: direitosvalemmais.org.br
Segundo a integrante da Rede Internacional de Ativistas pela Educação do Fundo Malala, essa ofensiva contra a educação não foi somente na perspectiva de destruir as conquistas acumuladas nas últimas décadas. “Foi de tentar impor um novo projeto educacional comprometido com a obediência de uma ordem desigual e autoritária. A noção de direito humano à educação foi colocado em xeque.”
Denise enumera três grandes eixos que colocaram esse tema em evidência:
>> A desconstrução do Plano Nacional de Educação (PNE) e de todas as instâncias e órgãos comprometidos com o enfrentamento às desigualdades educacionais. Um desmonte de todo um planejamento educacional de médio e longo prazo;
>> O sufocamento do financiamento educacional, em especial por conta da aprovação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 95, conhecida como PEC do Teto de Gastos Públicos, em 2016. Isso inviabilizou não só a expansão, mas também o custeio de serviços básicos nas unidades de ensino;
>> E a promoção de agendas ultraconservadoras, de viés ideológico, como as escolas militarizadas, a educação domiciliar, o discurso falacioso da ideologia de gênero, além de ataques ao Programa Nacional do Livro Didático, perseguições a escolas e trabalhadores da educação que abordassem temas como gênero, raça, sexualidade, e temas como política de enfrentamento às desigualdades ou a leitura crítica da história do Brasil.
“É importante destacarmos que o grupo que elegeu o ex-presidente Bolsonaro aliou o ultraconservador – como os defensores da chamada “Escola Sem Partido”, grupos fundamentalistas religiosos -, juntamente com a outra frente ultraliberal, do Estado mínimo, de defesa do desmonte da capacidade do Estado e das políticas públicas”, argumenta a professora
Com o novo governo, frisa Denise, há a esperança de avanço nas políticas educacionais, a retomada de conquistas históricas perdidas e retomar agendas que ficaram paralisadas nos últimos anos.
“É fundamental, para desbolsonarizarmos o país e avançarmos numa cultura democrática, que a noção de qualidade educacional ultrapasse algo muito centrado e padronizado em testes padronizados em Matemática e Língua Portuguesa, e é necessário elevar esses sistemas para uma noção mais ampliada de qualidade da educação. Chamávamos a atenção disso inclusive em governos petistas. Nos governos Lula e Dilma, nós tivemos conquistas importantes, como diretrizes curriculares nacionais de educação em direitos humanos, relações raciais, meio ambiente e outras importantes para enfrentar agora esses desafios, mas isso não foi implementado e nem ganhou centralidade nas agendas dos governos à época.”
“Para construirmos democracia, precisamos, de fato, refletir sobre o autoritarismo que está na base da estrutura de relações de poder do nosso país”
Perspectivas e desafios para os próximos anos
A professora Denise observa que governos autoritários, extremistas ou de cunho golpista priorizam a educação por sua capilaridade: é ela que chega mais próxima da população e tem uma relação cotidiana por anos e anos. Além de ser um serviço e um direito que mobiliza, no Brasil, por exemplo, milhões e milhões de pessoas.
“Se considerarmos apenas a Educação Básica brasileira, são mais de 47 milhões de crianças, adolescentes, jovens e adultos que se deslocam até uma unidade de ensino para participar de sua trajetória educacional. É um espaço muito importante de formação, convívio, acesso ao conhecimento e de construção de valores das pessoas.”
Foto: Tânia Rego / Agência Brasil
Devido a toda essa importância e diante dos desafios impostos pelo último Governo Federal e pela Covid-19, Denise elenca alguns desafios e necessidades para o campo nos próximos tempos, confira:
1. Reconstruir o próprio Ministério da Educação (MEC) e dotá-lo de maior capacidade para enfrentar desafios como o do ultraconservadorismo na educação; 2. Priorizar o fim do Teto de Gastos Públicos e propor um novo regime fiscal; 3. Reconstruir o Pacto Federativo na Educação, por meio do almejado Sistema Nacional de Educação; Retomar o Plano Nacional de Educação com estados e municípios; 4. Propiciar que a política educacional contribua efetivamente para a construção de uma cultura de país democrático; 5. Promover a laicidade do Estado e da educação pública; 6. Pautar na educação o enfrentamento ao racismo, a xenofobia, a LGBTfobia, do capacitismo e de tantas outras desigualdades no centro dos discursos do ódio; 7. Reconhecer e trabalhar a memória brasileira, tão silenciada e apagada, o que contribui para enfrentar a cultura autoritária presente em nossa história; 8. Promover uma campanha nacional para reflexão e renomeação de escolas que homenageiam figuras autoritárias do país. |
Vozes em ação
Luciana Petersen: “A checagem de notícias religiosas se mostra muito urgente”
Comunicadora, feminista, negra, cristã, progressista, podcaster, redatora e jovem. Luciana Petersen é uma mulher de múltiplas atuações, que unem, principalmente, a comunicação e a religião. Temáticas bastante presentes nas últimas eleições majoritárias no Brasil.
Luciana está envolvida em diversos projetos comunicacionais que unem esses dois temas, como: Coletivo Bereia, Novas Narrativas Evangélicas (comunidade-plataforma de reconhecimento e afirmação da pluralidade evangélica) e o Projeto Redomas (com o objetivo de fortalecer as vozes das mulheres dentro dos espaços de fé e cristãos).
Perseguição a igrejas, líderes e religiões. Fechamento de templos religiosos. Essas foram algumas das temáticas amplamente presentes em notícias falsas disseminadas durante o período de campanha das eleições de 2022. Uma das que mais repercutiu foi a de que o então candidato Lula fecharia igrejas, tema que dominou as campanhas e debates presidenciais.
Mas esse exemplo é apenas um em meio a informações falsas diárias que precisam ser desmentidas sobre religiões, o que motivou o surgimento do Coletivo Bereia, tido como o primeiro do gênero no Brasil especializado em apurar se uma informação é falsa ou verdadeira.
“A checagem de notícias religiosas é muito urgente. Temos percebido no trabalho do coletivo que existem muitas fake news, ou seja, mentiras, correntes de WhatsApp, que têm um pânico moral que é facilmente absorvido pelo público cristão, evangélico ou católico. São notícias que têm um apelo muito forte, que acabam se infiltrando nos grupos de igreja, das comunidades.”
Luciana explica que essas fake news acabam tendo capilaridade nos meios religiosos, e, muitas vezes, as entidades e lideranças do campo religioso não sabem disputar a narrativa. “Por isso é necessário olharmos para essas informações e entender qual é o pano de fundo delas, porque há pânico moral em volta da família, de fechar igrejas, porque isso mobiliza tanto as pessoas”, questiona.
A comunicadora enxerga que a extrema direita, não apenas em momentos de disputa política, tem se apropriado dos símbolos e signos religiosos, como versículos bíblicos, músicas, hinos de louvor. “O campo cristão progressista e democrático precisa se levantar e dizer que somos sim evangélicos, religiosos, que estamos do lado da justiça e da democracia, porque acreditamos que é isso que o evangelho de Cristo nos convida a fazer.”
Luciana deixa um importante recado para todas as pessoas e organizações engajadas em defender a democracia brasileira: a comunicação é essencial para fazer essa contranarrativa de discursos extremistas.
Estudante cria projeto para ampliar acesso de jovens periféricos a oportunidades de formação
Como bem explica Denise Carreira, a educação, no sentido mais amplo do termo, é essencial para enfrentar os desafios atuais impostos ao Brasil, e foi pensando assim, ao olhar para a sua própria vida estudantil, que Sabrina Cabral fez e faz a diferença onde vive.
Criadora do Projeto RUMA, que visa despertar a sustentabilidade e liderança para jovens das áreas de Ciências, Tecnologia, Engenharia e Matemática, especialmente nordestinos de minorias sociais, Sabrina também atua na mobilização de jovens em defesa dos direitos humanos, meio ambiente e educação por meio de iniciativas como o #tmjUNICEF, do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF Brasil.
“A RUMA veio justamente para melhorar e ampliar esse trabalho de impacto que eu já vinha fazendo, e surge a partir do olhar para os programas e políticas públicas da cidade de Fortaleza e também a partir do meu aprendizado dentro da universidade”, conta Sabrina.
A jovem é estudante de Engenharia Civil na Universidade Federal do Ceará (UFC) e criadora de conteúdo digital sobre protagonismo e oportunidades para jovens de baixa renda em sua conta no instagram (@sanydapeste). “Tudo começou na universidade, quando percebi que as coisas que aconteciam ali não chegavam a outras pessoas, como quando eu estava no ensino médio público.”
A partir de então, Sabrina passou a divulgar em suas redes sociais programas de bolsas, capacitações, palestras e demais oportunidades voltadas para a educação. “Por pesquisar essas oportunidades a outras pessoas, ingressei no programa Bolsa Jovem da prefeitura de Fortaleza, que exigia a participação em atividades em nível nacional. Então comecei a pesquisar sobre essas oportunidades, e foi quando percebi que faltavam pessoas como eu, de regiões periféricas. Fui tendo essa consciência, e comecei a direcionar o meu trabalho a buscar parcerias com instituições com o objetivo de dar oportunidade a jovens da minha região, seja de Fortaleza ou do Nordeste como um todo”, relembra.
A jovem é embaixadora regional do Dia Internacional da Juventude com o IYD Brasil, no qual ajudou a fundar o projeto Juventude Inclusiva. Em 2020, foi uma das vencedoras do Prêmio Mude o Mundo como uma Menina, da plataforma Força Meninas e, em 2022, participa do Hub de Lideranças, uma iniciativa do Instituto Votorantim.
Sabrina ainda contribui como produtora de conteúdo com o Impacta Nordeste, o primeiro portal dedicado ao ecossistema de impacto social na região. “Eu comecei tudo isso a partir das minhas particularidades, como jovem da periferia, do Nordeste, e isso fez eu identificar e enxergar o meu público”, afirma a engenheira.
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