Publicado em
11/12/2023
Enquanto publicação apresenta propostas para o enfrentamento dos desafios no território amazônico, bispos da região têm realizado incidência junto ao Executivo e Judiciário com demandas dos povos e comunidades locais.
Por Elvis Marques*
Foto: Livro Diálogos Amazônicos: contribuições para o debate da sustentabilidade e inclusão
Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) sobre a redução em 42,5% de desmatamento na Amazônia entre janeiro e julho de 2023 foram comemorados pelo atual governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o qual tem encampado a agenda ambiental mundo afora, como na Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas, a COP 28. O alívio, evidentemente, chegou para as organizações sociais que se debruçam sobre o tema, e, principalmente para a população amazônida, que tem sofrido com queimadas, secas e inundações.
O número positivo, no entanto, é visto com cautela, já que ainda há muito a ser feito, afinal, em 40 anos a floresta perdeu uma área equivalente à França em vegetação, cerca de 52 milhões de hectares, segundo o MapBiomas.
Uma das contribuições para mudar esse cenário parte da união e colaboração de 88 pesquisadores doutorandos e pós-doutorandos de 12 países: Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Peru, Suriname, Venezuela, Guatemala, México, EUA, Itália e Países Baixos. Cerca de 60% desses estudiosos são brasileiros, o que inclui membros da Operação Amazônia Nativa (OPAN), primeira organização indigenista fundada no Brasil, em 1969.
Toda essa sabedoria e conhecimento estão reunidos no livro Diálogos Amazônicos: contribuições para o debate da sustentabilidade e inclusão, publicado pela Escola São Paulo de Ciência Avançada (ESPCA) – Amazônia Sustentável e Inclusiva. A publicação aborda questões como a degradação, impactos de larga escala, inclusão, diversidade cultural regional e transnacional e, ainda, aspectos relacionados à governança local e transdisciplinaridade.
Gustavo Silveira, coordenador técnico da OPAN, explica que o livro é fruto de um esforço da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em olhar e dedicar esforços de pesquisa para a Amazônia buscando envolver atores e instituições locais. “Esse passo é de fundamental importância pois acredito que as soluções para os desafios estão na própria Amazônia.”
José Cândido, indigenista da OPAN e co-autor de um dos capítulos do livro, aborda a questão da governança local, ou seja, que a população amazônida precisa ser consultada sobre a tomada de decisão em relação à floresta, desde o uso dos recursos naturais, ao futuro que desejam para as suas vidas. “O enfrentamento das mudanças climáticas é mais efetivo quando está firmado na terra, no local em que as pessoas vivem. Nosso alerta é para que as esferas governamentais e privadas não se esquivem de relações responsáveis com as organizações locais de povos e comunidades tradicionais.”
A publicação é composta por 10 capítulos, e pode ser baixada gratuitamente em português, espanhol e inglês. Acesse aqui e confira. |
Escuta dos povos amazônicos
Após um período de escuta de várias pessoas que atuam junto à população dos nove estados da Amazônia Legal, a Rede Eclesial Pan-Amazônica (REPAM-Brasil) e bispos que atuam no território se reuniram com, ao menos, dez ministérios do governo federal e com o Supremo Tribunal Federal (STF) para agendas de diálogo e incidência em defesa do bioma e do equilíbrio climático.
Segundo o organismo ligado à Igreja Católica, o objetivo da mobilização é articular soluções sobre os resultados do processo de escuta dos povos da Amazônia, orientando a efetivação de políticas públicas nos estados e pelo governo.
“Vivemos, hoje, uma situação de calamidade por conta do garimpo ilegal, pesca predatória e alta contaminação por mercúrio. As terras devem ser cuidadas e preservadas”, afirmou, à Revista Casa Comum, Dom Leonardo Steiner, cardeal e arcebispo de Manaus (AM).
Sobre as reuniões com ministros, Dom Leonardo contou que “em nenhum momento [antes] tivemos a possibilidade de sentar à mesa para o posicionamento da Igreja em relação aos povos amazônidas, e agora estamos em peregrinação dialogando com os ministérios, tendo a possibilidade da escuta.”
O documento intitulado A escuta dos povos amazônicos, entregue aos ministérios, como a Casa Civil, e à Suprema Corte, trata de temas como: insegurança alimentar e fome, acesso à água potável, conflitos fundiários, demarcação de territórios, trabalho análogo à escravidão, mineração, desordem fundiária, expansão agrícola, demarcação pendente das terras indígenas, conflitos agrários, criminalização das lideranças sociais, ameaças de morte e expulsão das famílias de seus territórios, além da exploração de petróleo na Foz do Rio Amazonas, transição energética justa e mercado de carbono.
No documento elaborado pela REPAM, no ponto que trata da emergência/justiça climática, a entidade afirma que:
[…]“há muita preocupação com os eventos extremos que vem ocorrendo no mundo, no Brasil e na Amazônia. O olhar sobre as riquezas da Amazônia está sendo maior do que o olhar sobre as pessoas que vivem nela. É muito preocupante que o Brasil não esteja atuando como protagonista mundial na substituição dos combustíveis fósseis por energia limpa e renovável, mas atuando no sentido de continuar este tipo de exploração, ainda mais na Amazônia.”
Além da extensa listagem de denúncias enviadas aos órgãos, os povos e comunidades ouvidos pela REPAM apontam alguns elementos que têm ajudado a defender suas vidas, território e floresta em pé: a incidência para construção de protocolo de consulta dos povos indígenas conforme a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT); o trabalho de reflorestamento e agroecologia junto às aldeias, escolas e comunidades; a organização e a mobilização das mulheres, projetos de economia solidária e agroecologia, e outras ações.
*Com informações da OPAN
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