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Publicado em

24/04/2025

Cultura como elemento libertador e emancipatório da sociedade

Editorial da 12ª edição da Revista Casa Comum.

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A Revista Casa Comum adota, em cada edição, um tema central para aprofundar, estabelecendo uma cadência e conexão entre os assuntos principais dos volumes anteriores, sempre interligados pelo contexto sociopolítico em curso. Desse modo, por que o tema da cultura – foco central deste número da revista – é tão urgente diante das questões que envolvem democracia, dilemas das cidades, urgências climáticas e educação, pautados ao longo das últimas publicações.

A origem da palavra “cultura” já deflagra tal relevância, que significa “cultivar, transformar”. Essa base conceitual é explícita na música Cio da Terra, de Milton Nascimento e Chico Buarque: “Debulhar o trigo. Recolher cada bago do trigo. Forjar no trigo o milagre do pão. E se fartar de pão…”. Eis a fantástica plasticidade do processo do que chamamos de cultura, como elemento transformador, agregador e criador.

O Papa Francisco, referência humanitária em nossos dias, aponta que não haverá mudança significativa no destino do planeta se não modificarmos o nosso estilo de vida, baseado na cultura do consumo, descarte e inconsequência com o comum. Para isso, é preciso promover uma cultura do cuidado, da sensibilidade, da alteridade e da gratuidade, contrapondo a lógica de financeirização da vida pelo primado do capitalismo ignorante e depredatório.

Já o conceito de cultura dialoga – e muito – com o conceito de educação, pois promove a capacidade do ser humano em produzir seus significados, emoções e percepções sobre o mundo e seus atravessamentos existenciais e políticos.

Num momento em que não vivemos ainda no novo paradigma como sociedade, a cultura é uma forma
de resistência e de atualização crítica do que somos e deveríamos ser como humanidade e como planeta.

Nas quebradas, nas ruas, nos territórios periféricos, a cultura surge como uma oportunidade de denúncia e alerta para a cegueira da sociedade e o modo de se organizar de forma excludente e injusta. A cultura, nesse sentido, é a expressão mais potente que atravessa o desejo e a razão atenta à realidade que o ser humano se envolve.

O patrono da educação brasileira, Paulo Freire, faz muito bem o casamento entre educação e cultura, ao apresentar que cada ser humano nasce para a liberdade, e que o processo histórico exige a autonomia do ser humano como sujeito, que deve aprender a ler o mundo, e não apenas interpretá-lo, mas que tenha capacidade e condições de o transformar. É a tradução mais coerente com a perspectiva da cultura como elemento libertador e emancipatório da pessoa e da sociedade como um todo.

Por isso, a cultura, como essa arte humana de produzir sentidos e percepções acerca da vida de forma direta e poética, não pode ser entendida como uma expressão menor, feita por poucos, que ousam criar e produzir, fora da lógica mecanicista de uma rotina capturada pelo interesse de mercado. A cultura deve ser entendida como elemento intrínseco do que entendemos por sociedade e política, como elemento patrimonial de um país e de uma nação.

Nas páginas desta 12ª edição, vamos conhecer práticas expressivas de promoção da cultura como forma de encontro, formação e produção de sentidos, em especial, onde o peso do sistema excludente social e econômico esmaga milhares de pessoas e todo o seu potencial criativo e imaginário.

Transformar a cultura como ferramenta de política pública é um desafio societário e não só de governos, de entender a cultura como um direito fundamental, assim como a alimentação e a moradia. Cultura é a base da existência humana. Uma nação que não coloca em sua mesa de prioridades a cultura é um país que não sonha com a soberania e nem espera que seu povo seja construtor da transformação do existente no hoje, baseado em sua tradição histórica.

Chamemos para nossas rodas e planejamentos artistas e produtores culturais, para pensar em outras formas de mobilizar e ressignificar mentes e corações para a utopia de um novo tempo, uma nova sociedade, uma nova política, uma nova vizinhança, uma nova comunidade e uma nova forma de ser e estar neste mundo a partir da poética da realidade e do Bem Viver.

Fábio Paes
Coordenador da Revista Casa Comum

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