Publicado em
29/08/2023
Por Ana Beatriz Fernandes, Lucas Galvão e Tamires Sena, da Pulso Público
Templo Budista de Brasília. Foto: Wilson Dias / Agência Brasil
A ascensão de grupos ligados a diferentes religiões nos postos representativos das instituições políticas, a previsão constitucional da liberdade religiosa como direito fundamental e os constantes ataques aos locais de cultos, acarretaram um cenário de mudanças na produção legislativa brasileira. A última Legislatura do Congresso Nacional (2019-2022), por exemplo, contou com iniciativas que evocaram a diversidade, como a Frente Parlamentar em Defesa da Liberdade Religiosa e da Cultura de Paz e a de Liberdade Religiosa do Congresso.
Ainda, no que diz respeito a esses grupos, há destaque para a Frente Parlamentar Evangélica do Congresso Nacional e a Frente Parlamentar Católica Apostólica Romana, ambas da atual legislatura (2023-2026). A disputa em torno dos temas ganha força, inclusive no que diz respeito ao que é “diversidade religiosa”, ou, até mesmo, sobre o que seria “liberdade de expressão, de pensamento e de crença”.
A religião sempre teve protagonismo na disputa eleitoral e, em 2022, ficou ainda mais em evidência, principalmente no âmbito das legislações estaduais, isso sem falar na luta pelas diversas narrativas o que, por sua vez, robustece os conflitos do jogo político.
Acompanhe as discussões de proposições e legislações para um maior controle social e compreenda os impactos dessas ações no cotidiano brasileiro.
A Constituição Federal e a liberdade religiosa
A Constituição Federal, em seu artigo 5o, inciso VI, proíbe qualquer discriminação ou preconceito e assegura a todos os cidadãos o direito de exercer as diversas fés religiosas de forma livre, bem como professar e praticar a religião de sua escolha, desde que não viole outros direitos ou a ordem pública.
No Brasil, os crimes de intolerância religiosa cresceram nos últimos anos. As religiões de matriz africana são as mais atingidas. No ano de 2020, foram notificados 86 casos, enquanto que, em 2021, o número subiu para 244 casos, de acordo com o 2º Relatório sobre Intolerância Religiosa: Brasil, América Latina e Caribe. A atuação de organizações da sociedade civil, grupos religiosos e parlamentares tem colaborado para que propostas sobre o tema entrem na pauta do Legislativo Federal.
Na Câmara dos Deputados, por exemplo, tramita o PL 6.418/2005 (antigo PLS 309/2004), do senador Paulo Paim (PT-RS), que define os crimes resultantes de discriminação e preconceito de raça, cor, etnia ou religião e aumenta a pena para quem cometê-los. A proposição possui outros 61 projetos apensados e foi aprovada nas comissões, aguardando inclusão na pauta do Plenário.
Na mesma Casa, ainda tramita o PL 1.804/2015, do ex-deputado Rogério Rosso (PSD-DF), que aumenta a pena e tipifica como crime hediondo o ato de escarnecer de alguém publicamente, por motivo de crença ou função religiosa. Se aprovado na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, seguirá para o Plenário.
Fique por dentro do tema:
• Relatório aponta aumento da intolerância religiosa no Brasil bit.ly/RCC_06_32
• Combate à intolerância religiosa volta à agenda do Governo Federal bit.ly/RCC_06_33
Saiba quais são as proposições:
• PL 6.418/2005 bit.ly/RCC_06_30
• PL 1.804/2015 bit.ly/RCC_06_31
PL das Fake News e religião
O PL das Fake News vem gerando repercussão na Câmara dos Deputados após apresentação do parecer do relator, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). O projeto, apresentado pelo senador Alessandro Vieira (MDB-SE), busca instituir a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. Atualmente tramita na Câmara, em regime de urgência, para apreciação no Plenário.
Em abril, circularam publicações falsas que concatenavam o mérito do projeto a conteúdos religiosos, alegando perseguição caso fosse aprovado. No entanto, desde sua apresentação em 2020, o texto exclui explicitamente os conteúdos religiosos, respaldado pelos artigos 5o, inciso IX, e 220 da Constituição Federal, que garantem a liberdade de expressão.
Em maio, líderes religiosos declararam apoio ao parecer, pois o projeto combate notícias falsas relacionadas à religião, à disseminação de ódio nas redes e oferece proteção a crianças e adolescentes. Porém, membros da bancada evangélica se opuseram ao projeto, argumentando que o combate às fake news não deveria usar acontecimentos sensíveis como justificativa.
O texto tem gerado discussões acaloradas na Câmara dos Deputados, com opiniões divergentes. As preocupações infundadas sobre conteúdos religiosos foram esclarecidas, visto que exclui explicitamente tais conteúdos, respeitando a liberdade de expressão. Diante da divergência entre líderes religiosos e membros de bancadas religiosas no Congresso, o relator pode ter o desafio de encontrar um equilíbrio entre proteção contra a desinformação e respeito aos direitos e diversidade de opiniões.
Fique por dentro do tema:
• PL das Fake News: O que diz o parecer sobre a liberdade religiosa bit.ly/RCC_06_35
• Análise | O PL das Fake News não penaliza os valores cristãos bit.ly/RCC_06_36
• Bancadas evangélica e católica se posicionam contra PL das Fake News, mas grupo religioso contesta bit.ly/RCC_06_37
Saiba quais são as proposições:
• PL 6.418/2005 bit.ly/RCC_06_30
• PL 1.804/2015 bit.ly/RCC_06_31
Práticas regionais que inspiram na luta contra a intolerância
Estados e municípios saíram na frente no combate à intolerância e na garantia da expressão dos credos, sendo inovadores nas ações de conscientização, em campanhas educativas e visibilidade.
No Rio de Janeiro, por exemplo, duas iniciativas merecem destaque: a criação do “Programa Pense o que quiser, mas respeite a minha fé”, do deputado estadual Átila Nunes (MDB-RJ), e o Abril Verde, dedicado às ações de combate para prevenção e conscientização sobre intolerância religiosa da deputada estadual Renata Souza (PSOL-RJ). Já no Distrito Federal, a luta para aprovação da Lei 7.226/2023 é regada de destruição e perdas para os terreiros do DF, além do reconhecimento dos inúmeros ataques como um problema público por parte da Frente Parlamentar de Intolerância Religiosa.
Conheça algumas leis estaduais que tratam do assunto:
DISTRITO FEDERAL
• Lei 7.226/2023 (PL 2.394/2021) – Institui diretrizes e ações para o Programa Distrital de Combate ao Racismo Religioso. bit.ly/RCC_06_38
SÃO PAULO
• Lei 17.346, de 12/03/2021 – Lei Estadual de Liberdade Religiosa. bit.ly/RCC_06_39
• Lei 17.157/2019 – Dispõe sobre penalidades administrativas a serem aplicadas pela prática de atos de discriminação por motivo religioso. bit.ly/RCC_06_40
AMAZONAS
• PL 85/2022 – Semana do Combate à Intolerância Religiosa. bit.ly/RCC_06_41
BAHIA
• Lei 13.182/2014 – Institui o Estatuto da Igualdade Racial e de Combate à Intolerância Religiosa do Estado e dá outras providências. bit.ly/RCC_06_42
GOIÁS
• Lei 21.956/2023 – Política de Combate à Intolerância Religiosa no ambiente escolar. bit.ly/RCC_06_43
MINAS GERAIS
• PL 357/2023 – Lei Estadual de Liberdade Religiosa no Estado e outras providências. bit.ly/RCC_06_44
• PL 5.009/2018 – Estabelece penalidades administrativas para atos de intolerância religiosa praticados por servidor público do Estado. bit.ly/RCC_06_45
PARANÁ
• Lei 21.074 de 30/05/2022 – Dispõe sobre a liberdade religiosa. bit.ly/RCC_06_46
PARAÍBA
• PL 12/2023 – Institui diretrizes e ações para o Programa Estadual de Combate ao Racismo Religioso. bit.ly/RCC_06_47
MATO GROSSO
• PL 156/2022 – Determina a livre manifestação religiosa em qualquer ambiente do Estado. bit.ly/RCC_06_48
ESPÍRITO SANTO
• Lei 11.610/2022 – Institui o Estatuto de Liberdade Religiosa no Estado. bit.ly/RCC_06_49
SERGIPE
• Lei 7.054/2010 – Institui o Dia Estadual de Combate à Intolerância Religiosa. bit.ly/RCC_06_50
RIO DE JANEIRO
• Lei 9.212/2021 (PL 4.146/2018) – Programa de Assistência às Vítimas de Intolerância Religiosa no âmbito do Estado. bit.ly/RCC_06_51
• Lei 8.113/2018 (PL 128/2015) – Cria o Estatuto Estadual da Liberdade Religiosa. bit.ly/RCC_06_52
• PL 4.257-A/2018 – Proíbe o assédio religioso em ambientes públicos e privados. bit.ly/RCC_06_53
OUTRAS LEGISLAÇÕES EXISTENTES
• Artigos 19, I e 5o, VI da Constituição – Emendas constitucionais. bit.ly/RCC_06_54
•Artigo 44, § 1o, Código Civil. bit.ly/RCC_06_55
• Lei 14.532/2023 – altera leis anteriores para tipificar como crime de racismo a injúria racial. bit.ly/CasaComum_E4_46
•Lei 12.288/2010 – Estatuto da Igualdade Racial. bit.ly/RCC_06_56
•Lei 7.716/1989 – Define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. bit.ly/RCC_06_57
• Lei 11.635/ 2007 – Institui o dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa. bit.ly/RCC_06_58
Editorial da 5ª edição da Revista Casa Comum.
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