Publicado em
03/06/2025
Organizações promotoras da Cúpula dos Povos afirmam que é preciso rever o modelo econômico e eliminar o uso de combustíveis fósseis. A Revista Casa Comum inaugura série de reportagens sobre a Cúpula, realizada no mesmo período em que a COP 30, em Belém (PA).
Por Elvis Marques
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Paralelamente à 30ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre Mudanças Climáticas (COP 30), Belém (PA), receberá, entre os dias 12 e 16 de novembro, a Cúpula dos Povos, um espaço amplo que, desde o evento da ECO-92 ou Rio-92, realizado no Rio de Janeiro (RJ), reúne movimentos populares, povos e comunidades tradicionais, coletivos, redes e organizações da sociedade civil.
Com a participação de mais de 760 organizações nacionais e internacionais, a Cúpula dos Povos começou a ser organizada em março de 2023, quando as entidades se reuniram para definir uma equipe diversa para a representação da iniciativa. Desde então, foram realizados encontros em Brasília (DF) e durante a COP 28, em Dubai.
“A Cúpula dos Povos é um evento paralelo e independente, pois temos a certeza que a COP não trará, mais uma vez, as respostas necessárias às demandas dos povos. Quem sente na pele as alterações climáticas e todas as consequências dos mega projetos ditos de desenvolvimento são os povos e comunidades das florestas, das águas e das periferias das cidades”, explica Araê Lombardi, membro da direção nacional do Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM), entidade que compõe a Comissão Política da Cúpula.
O dirigente do MAM afirma que a Cúpula dos Povos não é apenas um evento, e sim um processo continuado e internacional, conduzido por aqueles e aquelas que menos contribuíram para as mudanças no planeta. “A gente que sobrevive há séculos à exploração capitalista, da natureza, dos povos e da classe trabalhadora, temos muito mais respostas para apresentar do que a COP e daqueles que visam a expansão da sua lucratividade em cima da natureza.”
Revista Casa Comum na Cúpula dos Povos
A Revista Casa Comum, uma iniciativa do Sefras – Ação Social Franciscana e com coordenação editorial do Estúdio Cais, compõe a organização da Cúpula dos Povos. Fábio Paes, coordenador da publicação, conta que os franciscanos integram o debate e o desenvolvimento do evento por meio do Serviço Inter-Franciscano de Justiça, Paz e Ecologia (Sinfrajupe).
“Pretendemos, por meio da Ação Francisclariana, mobilizar todos os franciscanos em seus territórios, com caminhadas, audiências públicas, ações ecológicas e pequenas cúpulas locais, além da nossa participação em Belém [PA] com uma comitiva internacional e a promoção de diversos eventos no local”, contextualiza.
De olho na última e na atual COP
Realizada anualmente, a Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas – também conhecida como Conferência das Partes – é um encontro mundial global no qual líderes mundiais, cientistas, organizações não governamentais e representantes da sociedade civil debatem ações e acordos para o combate às mudanças do clima. A COP é considerada um dos principais eventos sobre o tema no mundo.
Ao portal de notícias do Planalto, o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, manifestou que a COP 30 será diferente de todas as outras. “Uma coisa é discutir a Amazônia no Egito, outra coisa é discutir a Amazônia em Berlim. Agora nós vamos discutir a importância da Amazônia dentro da Amazônia. Nós vamos discutir a questão dos indígenas, vendo os indígenas. Nós vamos discutir a questão dos povos ribeirinhos, vendo os povos ribeirinhos e vendo como eles vivem.”
Antes da COP desembarcar em solo brasileiro, a última edição, realizada em Baku, no Azerbaijão, foi marcada por uma série de impasses e tensões a respeito da nova meta de financiamento climático, a NCQG, alvo de oposição dos países em desenvolvimento. O Observatório do Clima relatou que essas nações classificaram como “um insulto e uma flagrante violação da justiça climática” a decisão do aporte de US$ 300 bilhões por ano até 2035 para o fundo. A quantia reivindicada para financiar ações climáticas nos países em desenvolvimento era de US$ 1,3 trilhões.
Outra polêmica é que o texto final da COP 29 não menciona os países desenvolvidos como os principais responsáveis pela crise climática, mas sim como nações na “dianteira dos esforços”.
“O acordo de financiamento fechado hoje em Baku distorce a UNFCCC [Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas] e subverte qualquer conceito de justiça. Com a ajuda de uma presidência incompetente, os países desenvolvidos conseguiram mais uma vez abandonar suas obrigações e fazer os países em desenvolvimento literalmente pagarem a conta. O Brasil agora tem mais uma tarefa espantosa para a COP 30: aumentar o financiamento e reconstruir a confiança entre os países”, disse, na época, Claudio Angelo, coordenador de Política Internacional do Observatório do Clima, em matéria veiculada pela página da organização.
Como Claudio manifesta, a COP de Belém tem grandes desafios, como o de ouvir os povos da Amazônia – estando em sua casa – e de aumentar o financiamento para que as nações possam lidar com os impactos causados pelas alterações do clima.
>> Acesse a página oficial da COP e confira os detalhes
>> Confira a cobertura da Revista Casa Comum sobre as conferências
Quais são as principais demandas da Cúpula dos Povos?
União entre os povos e o desafio climático
O Manifesto da Cúpula enfatiza que as secas, as cheias, os deslizamentos de terras e as falsas soluções climáticas “servem como instrumento de aprofundamento da desigualdade e das injustiças ambientais e climáticas, principalmente nos territórios, e atingem de forma cruel aqueles e aquelas que menos contribuíram para a crise climática, ecológica e civilizatória.”
Diante da complexidade das demandas e das possíveis soluções, o manifesto defende a importância de espaços coletivos, como a Cúpula, que defendem a democracia e a solidariedade internacional, e que enfretem o negacionismo, a extrema direita e a financeirização da natureza e do clima.
Fábio Paes argumenta que as Conferências do Clima da ONU são espaços de negociação de países, e, assim, há interesses que sobressaem diante de outros. Para ele, as nações sempre negociam a partir do fator econômico, o que impede os avanços, as mudanças de comportamento e o avanço de políticas públicas.
“Por outro lado, a Cúpula dos Povos surge como uma iniciativa legítima, altruísta e mobilizadora frente à elaboração de uma agenda enquanto sociedade civil organizada e uma proposta societária diferente. A Cúpula é um espaço popular e relevante diante de um contexto de tanta falta de decisões políticas e de interesses comuns e concretos para conter esse paradigma em que o ser humano é o centro de tudo. Por isso, pensamos que, para Belém, o grande foco deve ser a construção dessa agenda comum dos movimentos e das organizações que acreditam que é possível pensar num desenvolvimento e num mundo diferentes”, considera Fábio.
Expectativa
De acordo com o Araê, a organização da Cúpula estima que cerca de 12 mil pessoas, de diferentes países, participem do evento na capital paraense. “Se a gente acredita que é um processo, então não é só um debate e um evento, por isso esperamos que a Cúpula culmine em propostas e movimentações reais, e que a gente consiga alterar um pouco esse cenário de devastação política social e ambiental. Não adianta a gente só bater no processo de licenciamento [Ambiental, aprovado recentemente no Senado] se não tiver um outro projeto que faça um contraponto a isso, que é a reforma agrária popular, a agroecologia, a produção dos povos das águas, o manejo sustentável da floresta.”
A COP 30, apesar das dificuldades apontadas por Fábio e Araê, deve ser um espaço de incidência da sociedade civil e de governos atentos à agenda socioambiental. O Manifesto da Cúpula dos Povos destaca que a conferência precisa apresentar e endereçar as ações necessárias para o enfrentamento da crise climática. “É preciso rever o modelo econômico vigente e eliminar a produção e queima de combustíveis fósseis, responsável por mais de ⅔ das emissões que provocam o aquecimento global, bem como implementar políticas para o desmatamento zero.”
Araê diz esperar ainda que a Cúpula possa alimentar as mobilizações de rua, assim como nos anos 1990 e 2000, para que a população consiga mudar a correlação de forças no campo socioambiental. “Temos um projeto de vida, que coloca a natureza em conjunto com os povos. A gente faz parte da natureza, e devemos não apenas explorar para benefício próprio.”
Estudiosos, ativistas e defensores ambientais afirmam sobre a centralidade de um pensamento ecológico para desacelerar o contexto de emergências em razão das mudanças climáticas e o colapso ambiental.
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