Publicado em
26/03/2024
Mecanismos de persuasão e propaganda sempre existiram, assim como as fake news e as estratégias de manipulação, mas o digital amplia de modo exponencial o seu poder e abrangência. Saiba como identificá-las.
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Com a eleição de Barack Obama como presidente dos EUA, no ano de 2008, vimos iniciar uma nova era na política mundial, com candidatos e partidos abraçando plenamente as comunicações digitais como recurso essencial para informação, interação e integração social. Obviamente a televisão, que, por décadas, reinou com grande estilo, continua tendo papel de relevância, mas agora são as redes sociais e a tecnologia digital, especialmente a inteligência artificial, que ganham protagonismo, também no mundo da política.
Em sua campanha, Obama compreendeu que o mundo tinha mudado e que para se eleger seria preciso um planejamento diferente e uma estratégia específica para os ambientes digitais, com metas e objetivos próprios, servindo-se de recursos digitais para alcançá-los. Compreendeu que, com praticamente todos os eleitores on-line, deixando à disposição suas informações e dados, era relativamente fácil identificar os diferentes perfis e se dirigir a cada um de um modo específico e convincente, para não dizer manipulador.
Paralelamente à campanha tradicional, os estrategistas de Obama tiveram a excelente intuição de impulsionar uma campanha não apenas planejada e coordenada de cima para baixo, mas, sobretudo, com ações realizadas por pessoas comuns e anônimas, em ambientes digitais. Associada a essa estratégia, estava a utilização da inteligência artificial e da analítica do big data.
Com o avanço, tanto da inteligência artificial quanto do big data, vimos, alguns anos depois, em 2016, na eleição de Donald Trump, o auge da digitalização da política, com um impressionante monitoramento e utilização de dados, e o uso de tecnologia digital para distribuir informações, atacar adversários e criar falsos contextos de opinião e de apoio de base. Às redes sociais, portanto, se acrescentaram diversos comportamentos automatizados de distribuição de informação digital, que também foram utilizados no Brasil, ao menos desde 2018: a campanha de Bolsonaro inovou na utilização de uma rede social específica, o WhatsApp, auxiliado por um sistema de plataformas digitais e diversos sites “noticiosos” (muitos deles repletos de notícias falsas, as famosas fake news).
Enquanto os adversários continuavam a apostar nas estratégias tradicionais de campanha, como o poder da mobilização nas ruas e o maior tempo de antena na televisão, Bolsonaro convenceu a população por meio de mensagens digitais, explorando as oportunidades oferecidas pelas redes sociais digitais, espaços abertos e ainda sem uma regulamentação clara, sobretudo no campo ético (o PL 2.630/20 ou PL das Fake news é um esboço, mas está longe de dar respostas definitivas).
A campanha no WhatsApp foi muito eficaz porque apresentou significativas inovações, como ser horizontal, funcionar independentemente da campanha oficial, apoiar-se em uma infraestrutura de grupos hiperativos, ter enorme capilaridade e um alcance inigualável, com velocidade de difusão acelerada. Além disso, não é “controlada”, podendo-se mentir, falsificar, forjar, inventar, criar, manipular… tudo isso com pouca probabilidade de punição.
Em ano eleitoral como 2024, é fundamental compreender que estamos vivendo uma nova era da política, com novas estratégias eleitorais e espaços de campanha, infinitamente mais potentes que os tradicionais. A cultura digital, com destaque para as redes sociais, caracteriza-se como a forma principal da esfera pública, política e cultural hoje. Os ambientes sociais são espaços de convivência nos quais todos nós transmitimos e consumimos informações e conteúdos diversos, locais onde nos expressamos e manifestamos, onde nos relacionamos e influenciamos (ou somos influenciados). Impossível pensar no futuro da sociedade sem a dimensão digital, por isso é impossível pensar no futuro da política sem a sua dimensão on-line, entendida como ambiente de informação, interação e integração.
Nesse sentido, é fundamental também pensarmos em valores e ética, além da tecnologia. Existem inúmeras experiências de utilização das novas tecnologias para o bem comum, mas quando pensamos no campo político é difícil superar a visão da “manipulação” e das fake news, do benefício pessoal em detrimento ao coletivo. Eis um desafio para a educação e para os agentes sociais, sobretudo, em ano eleitoral: mobilizar a visão crítica e o acompanhamento e a discussão da política, muito além do período de campanha.
Como identificar notícias falsas
Não seja manipulado nas próximas eleições! Preparamos um passo a passo que pode ajudá-lo a identificar uma fake news e não ser enganado:
7. Questione se é uma piada: será uma simples brincadeira ou piada?
8. Interesses ocultos: por que esta notícia chegou até mim? Quem ganha se eu a compartilhar?
9. Revise seus preconceitos: será que meu julgamento ou ideais não estão prejudicando minha interpretação do texto?
10. Senso crítico e bom senso: como me sinto ao ler tal notícia? Vale a pena passá-la adiante?
Estamos diante de novos desafios que se assemelham em alguns aspectos aos do início da televisão e que foram amplamente estudados pelas escolas tradicionais da teoria da comunicação, mas que, por outro lado, são inéditos e, por isso, exigem atenção e cuidado, com análise detalhada e prudente dos seus impactos e consequências. Mecanismos de persuasão e propaganda sempre existiram, assim como as fake news e as estratégias de manipulação, mas o digital amplia de modo exponencial o seu poder e abrangência.
A questão fundamental, hoje, talvez consista em como passar de um uso da tecnologia e da inteligência artificial em proveito de interesses privados ou particulares para o seu emprego em benefício geral da sociedade, estando a serviço de governos mais democráticos e de políticas públicas mais participativas? Algo para se ter em particular atenção ao longo deste ano, para não sermos “surpreendidos” por uma campanha decidida por máquinas e algoritmos, em benefício de interesses obscuros e não em prol da população. Fique atento!
Saiba mais
Conheça sites e ferramentas que você pode pesquisar sobre transparência, participação e boa gestão pública:
*Darlei Zanon é assessor editorial e autor da Paulus Editora. Jornalista, teólogo e mestre em Comunicação, Cultura e Tecnologias da Informação pelo Instituto Universitário de Lisboa (ISCTE).
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