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Publicado em

07/03/2023

Participação popular na administração pública: um exercício de democracia

Conheça espaços de engajamento que têm papel fundamental na garantia de direitos
Por Dayse Porto

Acampamento Levante Popular da Juventude, Mineirinho, Belo Horizonte (MG), 2015. Foto: Isis Medeiros

A participação social é direito garantido na Constituição. Em um Estado Democrático, existem muitos espaços que visam fortalecer a democracia, assegurar o exercício da cidadania para todas as pessoas e, também, promover o controle social na administração e em programas da gestão pública.

Além do exercício do voto, o engajamento pode acontecer também ao opinar em uma consulta pública; na composição de um júri popular; ou, ainda, na participação em conselhos gestores, que atuam nos estados e municípios e, também, em nível nacional em diversas áreas de políticas públicas.

Em razão da aclamada “vitória da democracia” nas eleições presidenciais de 2022, existe muita expectativa em relação à retomada de processos participativos em instâncias consultivas e deliberativas e do controle social na administração pública, fundamentais para a tão esperada “reconstrução” do Brasil nos próximos anos.

O histórico da participação popular

Desde 1994, os governos de Fernando Henrique Cardoso e Lula vêm ampliando a rede de conselhos nacionais: FHC criou 19 conselhos e Lula, 41. Esse processo culminou em um grande avanço na participação da sociedade civil no governo e foi fundamental para a elaboração e revisão de políticas
sociais
das últimas décadas.

Mas, a partir de 2016, os governos eleitos caminharam na contramão desse movimento e o Brasil experimentou um processo de extinção e desmantelamento dos conselhos nacionais e as conferências de políticas públicas, que mobilizaram milhões de pessoas em processos participativos nos anos anteriores, foram descontinuadas.

O desmonte foi tão grande que Gleisi Hoffmann (PT), então coordenadora de Articulação Política do Gabinete de Transição do presidente Lula, instaurou, ainda em novembro de 2022, o Conselho de Participação Social com o objetivo de promover o diálogo e a interlocução com as organizações da sociedade civil e movimentos sociais no período de transição.

Autor: Pelicano. Fonte: Cartilha Construindo a Plataforma dos Movimentos Sociais para a Reforma do Sistema Político no Brasil

8 PROPOSTAS PARA A RECONSTRUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NO BRASIL

A Rede Democracia e Participação, o Instituto da Democracia e da Democratização da Comunicação e a
Rede Brasileira de Orçamento Participativo realizaram, em dezembro de 2022, o seminário A Reconstrução da Participação Social no Brasil.

O evento reuniu lideranças de movimentos sociais, representantes de organizações da sociedade civil,
pesquisadores e gestores públicos que debateram o momento atual, desafios e caminhos possíveis para a
reconstrução da participação social no novo governo.

O documento síntese da atividade apresenta oito propostas, que são resultados das reflexões do encontro. Confira os pontos centrais:

1) Reconstruir e transformar, com criatividade e ousadia, um novo padrão de porosidade do governo federal que garanta efetividade à participação. Reconstruir as instituições da participação social e políticas orientadas por mecanismos de participação que foram destruídas; transformar, para ir além, e avançar na informação de qualidade, comunicação, educação popular e conscientização.

2) Tornar a participação social mais transversal, resgatando o papel da Secretaria Geral da Presidência da República, criando pontos focais em todos os órgãos da Administração Pública Federal, e um Conselho Nacional de Participação Social (CNPS) com funções de acompanhamento e articulação. Maior transversalidade também pode ser atingida se o planejamento orçamentário for utilizado como mecanismo de inserção em todas as áreas.

3) Estabelecer um Sistema Nacional de Participação Social (SNPS) com as seguintes características: popular, integrado, deliberativo, fiscalizador e orientado por princípios de equidade de gênero e raça e de inclusão, munido de mecanismos ativos de busca de grupos excluídos e mais vulneráveis, ou de segmentos fundamentais como os jovens.

4) Revogar, reativar e restituir: revogar o Decreto 9.759/2019 que extinguiu os órgãos colegiados da administração pública federal; reativar conselhos extintos antes do Decreto, como o CONSEA, e as conferências nacionais, que foram paralisadas; restituir conselhos e conferências de funções, recursos e composição que foram alteradas visando minar sua atividade.

5) Desenvolver um processo de Orçamento Participativo (OP) nacional que seja inclusivo, deliberativo e efetivo, articulado com o calendário do ciclo do planejamento orçamentário para que se possa garantir a previsão orçamentária e efetiva execução das decisões tomadas nas instâncias participativas.

6) Valorizar as experiências de definição, implementação e fiscalização de políticas públicas por movimentos sociais, reconhecendo sua contribuição ao aprimoramento das políticas e ao uso mais eficiente de recursos públicos e, ao mesmo tempo, fortalecendo as capacidades de organização e mobilização da sociedade civil.

7) Avançar na educação popular como uma fase fundamental da participação, tendo por referência marcos existentes e interrompidos, como a Política Nacional de Participação Social, o Sistema Nacional de Participação Social e o Marco da Educação Popular para políticas públicas. Vincular a Educação Popular ao centro articulador da participação no governo, ampliando o escopo da educação para incluir a formação da burocracia estatal (gestores e corpo técnico) em colaboração com a Escola Nacional
de Administração Pública (ENAP) e outras instâncias de formação de servidores.

8) Inovar na implantação de mecanismos de deliberação e participação direta de cidadãos (assembleias cidadãs, minipúblicos), com potencial para mobilizar e qualificar o debate público, principalmente em pautas marcadas pela polarização e desinformação. Merece especial atenção a incorporação da tecnologia digital, não como um canal paralelo de participação, mas como uma forma transversal de alimentar a participação do cidadão e o conhecimento de suas demandas.

Possibilidades de atuação: fique atento(a)

Existem várias instâncias de participação que precisam ser ocupadas pela sociedade civil: os conselhos (municipais, estaduais e nacionais), comitês populares, fóruns, conferências, consultas públicas, processos colaborativos de construção de ações civis públicas e projetos de lei de iniciativa popular são alguns dos exemplos de possibilidades. Entenda como funcionam alguns desses espaços e participe:

CONSELHOS

Os conselhos são responsáveis por controlar as ações do Estado a partir de representantes da sociedade civil que podem participar dos processos de elaboração, implementação e fiscalização de políticas públicas. Esse sistema favorece os mecanismos de transparência da gestão pública, estimula uma distribuição mais justa do orçamento e estabelece uma relação de corresponsabilização pelas decisões tomadas.

A Constituição estabelece que os conselhos municipais de saúde, educação e assistência social, por exemplo, devem ser ouvidos na elaboração de cada política pública. Conselhos de outras áreas, como do meio ambiente, da moradia, de mobilidade, dos direitos da criança, da juventude, das mulheres e
de idosos, podem ter função apenas consultiva – depende da legislação de cada município.

CONFERÊNCIAS

As conferências de políticas públicas são encontros periódicos em formato de plenárias que buscam, por meio do debate, alcançar um diagnóstico e propor diretrizes para determinadas políticas e podem ser realizadas no âmbito municipal, estadual, regional ou nacional. Nas conferências, são organizados grupos de trabalho abertos a qualquer cidadão.

Todos têm o direito de falar, mas não necessariamente o de votar, de modo que um número limitado de participantes serão escolhidos como delegados, para votar a resolução final do encontro. As resoluções e diagnósticos são encaminhados, via conselhos, para as respectivas pastas, podendo ser aproveitados tanto para a gestão da política em si, quanto para integrar um futuro Plano Plurianual (PPA) e planos setoriais, se for o caso.

Fonte Boletim Repente (Instituto Pólis), nº 29 agosto de 2008

AUDIÊNCIAS E CONSULTAS PÚBLICAS

Segundo a Constituição, toda vez que alguma decisão relevante de interesse público for tomada dentro da República, seja por qualquer um dos poderes, o povo deve ser chamado para ser ouvido.

Um exemplo é a elaboração e implementação dos planos diretores municipais, os quais necessariamente só podem ocorrer com a participação dos segmentos da sociedade em audiências públicas e sessões de debate. A proposta não é a busca de consensos e deliberações coletivas, tal qual ocorre nos conselhos, por exemplo, mas sim que, ao menos, a população tenha a abertura de ser consultada a respeito dos impactos que aquela determinada decisão pode gerar em suas realidades específicas.

As consultas públicas são, muitas vezes, utilizadas de modo complementar às audiências públicas. São realizadas por meio de mecanismos eletrônicos abertos e com tempo de duração. As consultas são mais direcionadas, contendo já um esboço da decisão, buscando-se medir a aprovação e os diagnósticos da população a respeito daquele tema, avaliando-se assim seu impacto social.

COMO PARTICIPAR?

Uma sociedade democraticamente engajada, ativa e com forte controle social requer espaços de participação local permanente, colegiados e articulados com os gestores públicos. Mesmo com os desmontes sofridos nos últimos anos, existem entidades consolidadas e com forte atuação dentro de
suas áreas de atuação e muito influentes no setor público.

Em dezembro de 2022, por exemplo, o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH) – entidade que tem por finalidade a promoção e a defesa dos direitos humanos no Brasil por meio de ações preventivas, protetivas, reparadoras e sancionadoras das condutas e situações de ameaça ou violação desses direitos – elegeu sua nova presidência e mesa diretora do biênio 2022-2024.

Para a presidência, foram eleitos os conselheiros Leonardo Pinho, da Associação Brasileira de Saúde Mental (Abrasme) pela sociedade civil, e André Carneiro, da Defensoria Pública da União, pelo poder público. Para a mesa diretora, foram eleitas Marina Dermmam, do Instituto Nacional para o Desenvolvimento Social e Cultural do Campo (Instituto Cultivar), e Virgínia Berriel, da Central Única dos Trabalhadores (CUT).

>> Acompanhe o CNDH: www.gov.br/participamaisbrasil/noticiascndh

O Conselho Nacional de Saúde (CNS) e o Ministério da Saúde realizarão, de 3 a 5 de julho de 2023, a 17ª Conferência Nacional de Saúde com o tema Garantir Direitos e Defender o SUS, a Vida e a Democracia – Amanhã Vai Ser Outro Dia, e as etapas municipais devem ser realizadas até março de 2023.

Nas etapas locais, serão elaboradas e aprovadas propostas e diretrizes que atendam às necessidades de saúde da população, sendo responsável pela formulação de propostas e revisão dos Planos Municipais de Saúde delineados para os anos de 2022 a 2025. Nessa fase, são eleitas, de forma paritária, pessoas delegadas que participarão das Conferências Estaduais de Saúde, que acontecerão entre abril e maio
de 2023. Para saber mais detalhes, é preciso consultar os calendários dos conselhos municipais.

>> Acompanhe o CNS e saiba mais sobre a 17ª Conferência Nacional de Saúde: conselho.saude.gov.br/

A organização Delibera Brasil, em parceria com a Rede Conhecimento Social e com financiamento da UNDEF – The United Nations Democracy Fund (Fundo das Nações Unidas para a Democracia) – é realizadora do projeto Democracia Deliberativa e Assembleias Cidadãs: enfrentando a desigualdade e a pobreza no Brasil, que tem como propósito estabelecer Assembleias Cidadãs em três cidades do Brasil:
Belém (PA), Fortaleza (CE) e Niterói (RJ).

As assembleias cidadãs são compostas por grupos de 30 a 100 pessoas, selecionadas aleatoriamente por meio de recrutamento ativo e sorteio, que se reúnem em encontros de imersão no assunto para embasar o processo de reflexão e decisão. Ao final, o grupo elabora um documento que registra a deliberação e as recomendações que orientam a implantação de soluções para questões públicas. O período de implementação do projeto é de julho de 2022 a junho de 2024.

>> Conheça a iniciativa

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