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Em Pauta

Publicado em

29/11/2022

O que jovens ativistas têm a dizer em defesa do meio ambiente

As novas gerações estão cada vez mais engajadas em ocupar espaços de debate e tomada de decisão, chamando atenção para a urgência de medidas de conservação de ecossistemas naturais
Por Maria Victória Oliveira

Foto: Jovens Pelo Clima / Reprodução 

Uma confluência de fatores fez com que, em setembro deste ano, a fumaça proveniente de queimadas na Amazônia e na região Centro-Oeste do país viajasse por quase três mil quilômetros e chegasse a cidades das regiões Sul e Sudeste, encobrindo o céu com um nevoeiro e forte cheiro de queimado. 

O desmatamento é apenas uma das ações que contribuem para as mudanças climáticas e para o desequilíbrio ambiental mundial, sobretudo em uma região de tamanha importância como a Amazônia. Segundo dados do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), entre janeiro e setembro deste ano, a área de floresta derrubada na Amazônia Legal foi de 9.069 quilômetros quadrados, o que é quase oito vezes maior do que a cidade do Rio de Janeiro. O índice de área desmatada na região é o maior nos últimos 15 anos. 

A situação retrata, na prática, o que Naira Santa Rita Wayand quer dizer quando afirma que mudanças climáticas representam um assunto de interesse de todas as pessoas. A coordenadora executiva de comunicação e desenvolvimento sustentável do Instituto Perifa Sustentável – organização da sociedade civil que mobiliza juventudes em prol de uma agenda de desenvolvimento sustentável para o Brasil a partir da justiça racial e ambiental – sofreu na pele um dos efeitos das mudanças climáticas no início de 2022. Natural de Petrópolis (RJ), Naira teve seu apartamento, no primeiro andar de um prédio, alagado devido às enchentes que são comuns na região no período do verão. 

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) estima que cerca de 3,3 a 3,6 bilhões de pessoas vivem, no mundo, em regiões altamente vulneráveis aos impactos da mudança do clima. Para a ativista ambiental, envolver-se nessa pauta é uma questão de sobrevivência. 

“Sabemos que existem zonas e territórios mais vulnerabilizados. Mas quando falamos de mudanças climáticas, é um assunto de todos nós independente do risco que achamos que corremos ou não. Se aconteceu no sul da Bahia, em Petrópolis ou na Flórida, nos Estados Unidos, então não é comigo? Há uma série de consequências, como ondas de calor e chuva de granizo, que afetam o todo.” 

Ativismo jovem e representatividade

Cada vez mais jovens ao redor do mundo estão percebendo a urgência de agir imediatamente em defesa do meio ambiente. Greta Thunberg, ativista sueca de 19 anos e idealizadora do movimento Fridays For Future, e Luisa Neubauer, alemã de 26 anos, são a prova de que é possível ser jovem e, ao mesmo tempo, marcar presença em coletivos jovens e ocupar lugares importantes de discussão sobre as medidas necessárias para mitigação dos efeitos das mudanças climáticas, como as COPs, as conferências do clima da Organização das Nações Unidas (ONU). Greta, por exemplo, participou de um debate promovido pelo Senado brasileiro no qual reforçou a urgência de medidas por parte de líderes mundiais em defesa do meio ambiente. 

Samela Sateré Mawé, representante do povo Sateré Mawé, estudante de biologia na Universidade do Estado do Amazonas, comunicadora da Associação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), secretária da organização Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé e ativista ambiental do Fridays For Future Brasil, fala sobre a importância de decolonizar, isto é, ocupar espaços que antes eram reservados apenas aos mais velhos. 

“Se a política e mudanças climáticas afetam todo mundo, inclusive a juventude, por que não contribuir? Os jovens podem ocupar o espaço em que já estão, seja na educação, na saúde, na política ou na questão ambiental. Cada um tem a sua parte.”  

Assim como Samela, Naira cresceu sabendo que gostaria de contribuir de alguma forma para a conservação dos ecossistemas. Quando criança, foi criada em meio à natureza. Mais velha, optou por se formar em gestão ambiental, conversando com outras áreas como planejamento e educação ambiental. “Eu vejo a juventude com uma voz que de fato ecoa e reverbera”, acredita.  

Naira Wayand, coordenadora executiva de comunicação e desenvolvimento sustentável do Instituto Perifa Sustentável 

Para a ativista, os mais jovens têm alta capacidade de mobilização e organização e podem contribuir de diversas maneiras a partir de objetivos claros. Como, por exemplo, na disseminação de temas, facilitando o acesso à informação e democratizando a pauta, elaborando projetos disruptivos e inovadores que consideram as especificidades de cada território e região, e a criação de novas tecnologias para combater mudanças climáticas. “Temos projetos incríveis ao redor do Brasil. São muitas frentes e um potencial de transformação gigantesco.” 

A pauta climática e o racismo ambiental

Hoje, com 24 anos, Naira, enquanto mulher jovem negra ativista, sente-se invisibilizada, e enxerga a sustentabilidade, desenvolvimento sustentável e ESG (sigla em inglês para environmental, social and governance; em tradução livre, meio ambiente, social e governança) ainda como pautas elitizadas e brancas, mesmo que muitos jovens negros estejam endereçando o tema a partir do seu trabalho de ativismo. 

“No Instituto Perifa Sustentável, eu tenho como um dos meus propósitos fazer nascer novas referências negras. Há jovens negros incríveis de diversas idades e formações contribuindo com a pauta. E quando digo que me sinto invisibilizada, falo também desse coletivo que precisa de visibilidade geral, e não só o Perifa, mas muitos outros que também fazem um ótimo trabalho.” 

Naira pontua que não é possível dissociar a luta contra as mudanças climáticas da pauta racial, uma vez que grupos historicamente negligenciados – como a população negra – são atingidos direta e desproporcionalmente por situações externas negativas decorrentes das alterações no clima. 

“Eu sempre digo que a crise das mudanças climáticas é uma crise de direitos humanos sem precedentes, porque ela evidencia abismos sociais. Quando falamos de racismos, precisamos desse “S” bem enfatizado, porque são muitas facetas, o ambiental e o climático são apenas duas delas. A mudança do clima tem cor, raça, gênero e etnia”, aponta Naira. 

O chamado racismo ambiental é igualmente complexo e se manifesta na falta de planejamento urbano, em casas sem a devida infraestrutura, em ruas que sofrem de alagamento, na falta de saneamento básico e no atraso na demarcação de terras indígenas e quilombolas. 

Foto: Mídia Ninja

Ativismo indígena na emergência climática 

Samela Sateré Mawé carrega o ativismo no sangue. Sua avó foi uma das fundadoras da Associação de Mulheres Indígenas Sateré Mawé, organizada, na década de 1990, para lutar pelos direitos das mulheres que foram retiradas da terra indígena Andirá Marau para viver em Manaus, onde sofreram uma série de preconceitos. 

Samela conta que, desde que consegue recordar, sempre participou de reuniões, atos, manifestos, exposições e debates relacionados ao movimento indígena e de mulheres, sendo que uma das grandes lutas dos povos indígenas é a demarcação de terras. A defesa do território caminha lado a lado com a pauta ambiental. 

Samela Sateré Mawé, representante do povo Sateré Mawé e ativista ambiental 

A jovem de 25 anos comenta que ser uma mulher, jovem e ativista amazônida é uma responsabilidade grande. A pessoa que assume esse papel, além de aceitar riscos e precisar abrir mão de muitas coisas, tem a tarefa de representar seus pares. Entretanto, ao mesmo tempo, é um caminho para ser uma das protagonistas da história de defesa dos direitos dos povos indígenas. 

Nós, povos indígenas, somos os principais defensores do meio ambiente, dos biomas, da fauna e da flora. Por isso, temos que ser considerados nos espaços que falam sobre a natureza, a Amazônia e os povos indígenas”, afirma. 

Demarcando as telas e as redes: o papel das mídias sociais 

Quase 85 mil pessoas acompanham as postagens de Samela em seu perfil do Instagram. Para ela, as mídias sociais são importantes nesse cenário de ativismo, pois representam uma ferramenta com potencial de influenciar pessoas em prol das causas socioambientais. Ela conta que exerce um papel de promover a compreensão sobre a importância dos povos indígenas para a preservação ambiental, sobretudo porque são os mais afetados pelos efeitos das mudanças climáticas. 

“É importante que nós influenciemos as pessoas para proteger o meio ambiente, além de descomplicar tudo o que precisam aprender sobre nossos direitos e justiça climática”, acredita a jovem. Se no mundo off-line fala-se sobre demarcar a política, Samela cita a importância de demarcar as redes e as telas, com cada vez mais ativistas ocupando as mídias sociais e espaços de construção de políticas que abrangem toda a população.

Fique por dentro das ações das juventudes! Acompanhe:  

Engajamundo: engajamundo.org 
Amazônia em Pé: amazoniadepe.org.br 
Greve Pelo Clima Brasil: @fridaysforfuturebrasil no Instagram
Instituto Perifa Sustentável: @perifasustentavel no Instagram

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